27/07/2010

Os Supremos em desenho animado.


Tendo lido a série The Ultimates, decidi conferir os dois desenhos animados produzidos em 2006 pelo Marvel Studios, a partir da criação de Mark Millar e Bryan Hitch. O que posso dizer é que, considerando as excelentes HQs que originaram Os Supremos – O Filme e Os Supremos 2, os desenhos são muito decepcionantes! Os roteiros pegam alguns elementos dos quadrinhos, mas o melhor do trabalho de Millar fica de fora. Já as imagens não lembram nem de longe a qualidade excepcional das páginas de Hitch. No geral, é muito mais pirotecnia para muito, muito menos qualidade artística.

Os Supremos – O Filme começa com o prólogo na Segunda Guerra e continua com a descoberta do Capitão América em animação suspensa, passando para um ataque dos alienígenas Chitauri, que motiva a formação do grupo de heróis. A concepção visual dos personagens não traz algumas das características que diferenciaram suas versões na série em quadrinhos. A animação em si é bastante pobre, ficando muito aquém do que se pode esperar de uma produção com o selo Marvel e principalmente dos filmes e séries de sua concorrente DC Comics.

Os Supremos 2 tem um visual e uma técnica de animação um pouco mais aprimorados. O roteiro, por sua vez, afasta-se bastante da HQ original, enfocando o personagem Pantera Negra e o reino fictício de Wakanda. Os alienígenas Chitauri são novamente a grande ameaça, ao lado dos dramas pessoais e dos conflitos interpessoais vividos pelos heróis. Enquanto desenho animado, essa sequência funciona melhor que o primeiro filme, mas mesmo assim nada que se compare a produções em 2D com elementos em 3D, como Star Wars: Clone Wars, por exemplo.

Bem mais interessantes que os filmes de animação em si são os minidocumentários nos extras dos DVDs. O primeiro, disponível com Os Supremos – O Filme, narra a trajetória dos Vingadores e o segundo, disponível com Os Supremos 2, fala sobre The Ultimates, ambos contando com depoimentos de autores e editores das HQs. Assim, se os filmes de animação não valem muito o investimento, para quem quiser saber um pouco mais sobre os quadrinhos Marvel, pelo menos os depoimentos de George Pérez, Mark Millar, Bryan Hitch e Joe Quesada valem uma conferida.

24/07/2010

Os Supremos e os Ultimate X-Men se enfrentam em Ultimate War.


Quando chegava ao fim de sua fase na série Ultimate X-Men e em meio à produção da excelente The Ultimates, o roteirista Mark Millar escreveu uma minissérie que colocou frente a frete os dois grupos de heróis. Publicada pela Marvel no primeiro semestre de 2003, dividida em quatro edições, Ultimate War contou com os bons desenhos de Chris Bachalo, arte-final de Tim Townsend e cores de Paul Mounts.

Lançada em 2001 na trilha do sucesso de bilheteria e tendo como inspiração X-Men – O Filme, a série Ultimate X-Men chegou com um ritmo dinâmico e o traço comercial dos irmãos Adam e Andy Kubert. Apresentando um novo começo alternativo para os heróis mutantes, essa revista voltada ao público jovem logo se tornou um sucesso, atraindo leitores que haviam descoberto os personagens através do filme e não precisariam conhecer décadas de cronologia para entender suas HQs.

Lançada em 2002, The Ultimates por sua vez trouxe uma abordagem mais adulta e menos comercial dos super-heróis, em que cenas de luta dão lugar a diálogos e a ação bombástica é substituída por um ritmo mais compassado. Reinventando os heróis Marvel clássicos para o século 21, a revista ilustrada pelo talentoso Bryan Hitch superou as expectativas, sendo a melhor série de super-heróis dos últimos dez anos e também uma fonte de inspiração para os filmes da Marvel.

Reunindo os dois principais grupos da linha Ultimate, em termos estilísticos e narrativos, Ultimate War foi um encontro dessas duas abordagens distintas. Traduzida no Brasil como "Guerra Suprema", devido ao nome dado por aqui ao grupo liderado pelo Capitão América, a minissérie tem como grande vilão Magneto, dando inicialmente mais destaque aos Supremos do que aos X-Men. Ainda assim, pelas implicações de disputa racial, a história está mais para uma aventura mutante.

Tudo começa com um atentado terrorista na Ponte do Brooklyn, que deixa centenas de vítimas. Enquanto Thor e Homem de Ferro resgatam os corpos das vítimas, Capitão América, Viúva Negra e Gavião Arqueiro saem à captura da Irmandade dos Mutantes. Os X-Men só dão mesmo as caras na segunda edição, mas logo Os Supremos roubam de novo a cena. Embora os diálogos e a interação dos personagens seja a tônica principal, eles não funcionam tão bem quanto em The Ultimates.

Uma razão para isso está no estilo de desenho e nas escolhas narrativas dessa HQ. Em 1994 e 1995, Chris Bachalo era o melhor artista das revistas de super-heróis, com fases excepcionais nas séries Ghost Rider 2099 e Generation-X. Com o passar dos anos, porém, seu trabalho pendeu para o lado dos mangás e animes, ganhando mais estilização no traço e recortes na narrativa. Assim, apesar de seu desenho em Ultimate War ser interessante, ele não serve tão bem ao roteiro de Millar.

Não faltam referências ao clima político e a fatos ocorridos nos primeiros anos após o 11 de Setembro; com isso, as sequências de ação foram deixadas para o final da segunda e terceira edições, explodindo no último número da minissérie. Aí sim as coisas ficam interessantes, com Colossus encarando o Homem de Ferro, Tempestade enfrentando o Thor, Wolverine versus Capitão América, etc. Infelizmente, já é tarde e as páginas da minissérie chegam ao fim, com um pouco mais de conversa.

Uma possível conclusão é que a abordagem que funcionou tão bem em The Ultimates e um estilo visual que serve às HQs de ação de Ultimate X-Men acabaram de certa forma se anulando em Ultimate War. Como resultado, a história avança na trajetória dos Ultimate X-Men, à qual esta minissérie pertence. Para os rumos dos Supremos, a história não interfere realmente, não fazendo falta aos fãs desses heróis, vistos em sua melhor forma nas revistas assinadas por Millar e Hitch.

21/07/2010

The Ultimates, a melhor série de super-heróis da década (II).


Dividida em treze capítulos, desde sua primeira edição The Ultimates foi um sucesso “de público e de crítica”. E não é por menos: uma trama bem conduzida, diálogos inteligentes, abordagem contemporânea, além de um visual detalhadíssimo e bem finalizado fazem dessa uma revista que realmente merece ser lida e vista. O interessante é que parte do que torna esse um trabalho tão particular aconteceu quase acidentalmente (como revelam os comentários dos autores na edição em capa-dura). Inicialmente, a ideia era ter-se uma primeira edição com 48 páginas, cuja metade inicial seria o prólogo passado na Segunda Guerra e o restante equivaleria ao que se vê nas quatro edições seguintes. Na melhor das hipóteses, o resultado seria uma boa HQ de super-heróis, mas sem uma das melhores qualidades da série: seu caráter compassado e comedido.

Nas primeiras edições de The Ultimates, não há uma cena de luta ou a ameaça de um supervilão a cada página; não há sequer exatamente um supervilão (pelo menos até o líder alienígena se revelar no décimo capítulo). Tudo começa com a que é possivelmente a melhor HQ do Capitão América na Segunda Guerra (influenciada pelas sequências iniciais do filme O Resgate do Soldado Ryan); ali se inicia uma situação que será resolvida apenas doze edições (e dois anos) depois. Passado o prólogo bombástico, nas três edições seguintes a ação dá lugar aos diálogos e à interação dos personagens, numa intrincada trama em que mais informações vão sendo adicionadas a cada página. Tudo culmina no número 5, em que temos uma das melhores e mais verossímeis sequências de luta dos quadrinhos de super-heróis (Os Supremos x O Hulk).

Em The Ultimates n°s 6 a 13, a história continua acima da média, mas há uma queda na qualidade (o que equivale a dizer que as HQs deixam de ser brilhantes para se tornarem ótimas). As piadas e tiradas acontecem, mas é a dramaticidade que predomina. E se o clima “pós-11 de setembro” dera o tom desde o início (com a presença do presidente George W. Bush e parte de Nova York em escombros), esse caráter é reforçado na sequência do memorial aos mortos no “Incidente Hulk” e pela retórica da segurança nacional, sem falar na ligação direta entre Os Supremos e as forças armadas. Outro fator que evidencia que estamos lendo uma série realmente contemporânea são as várias referências à mídia e as implicações de ser um super-herói num mundo em que a vida privada das "celebridades" não raramente se torna assunto dos telejornais.

Comparados à qualidade excepcional do trabalho de Millar no início da série, os números finais são revistas de super-heróis mais convencionais, com uma maior dose de ação e uma trama envolvendo nazistas e alienígenas (digna de Indiana Jones e A Guerra dos Mundos). O visual também perde um pouco da elegância e da linha mais clássica vistas inicialmente, assumindo um acabamento mais rápido e mais “fotojornalístico”. Ainda assim, o trabalho ricamente detalhado e as concepções originais de Hitch para os heróis Marvel comprovam porque ele é considerado um dos melhores desenhistas dos quadrinhos de super-heróis na atualidade. Além disso, a ótima dinâmica cinematográfica das páginas e os diálogos na medida permitem que os números 6 a 13 desenvolvam bem a história, fechando num confronto épico contra os alienígenas nazistas.

Sem violência excessiva ou polêmicas gratuitas, as cinco primeiras edições de The Ultimates conseguiram revitalizar heróis que andavam bastante desprestigiados. Isso é ressaltado pelo fato de essas revistas serem uma recriação da história de estreia dos Vingadores, produzida em 1963 por Stan Lee e Jack Kirby. E se todos os louros devem ser lançados sobre os mestres do passado, os devidos créditos devem ser dados a Millar e Hitch. Sua atualização dos heróis para o século 21 nos deu a mais condizente versão do Capitão América (antes de tudo, um soldado a serviço do país), uma simpaticíssima encarnação de Tony Stark (com uma armadura de aparência funcional), um interessantíssimo Thor (seria ele um deus nórdico ou um doente psicótico?) e um complexo Bruce Banner, que esconde o animalesco Hulk (uma montanha de músculos idiota).

Embora Gigante e Vespa pareçam menos críveis, podendo ter ficado de fora dessa série realista (afinal, para onde vai e de onde vem a massa corporal quando eles diminuem ou aumentam de tamanho?), todos os demais personagens se encaixam bem na trama. O destaque vai para Nick Fury, cuja versão Ultimate é a que mais se afasta dos quadrinhos originais, ganhando as feições e a presença espirituosa do ator Samuel L. Jackson. Aliás, numa das sequências, Os Supremos discutem quais astros de Hollywood interpretariam seus papeis num possível filme, e Nick Fury logo dispara: “O senhor Samuel L. Jackson, é claro!”. Inusitadamente, esse vaticínio se cumpriria em 2008, quando o ator interpretou o personagem na cena pós-créditos do primeiro filme do Homem de Ferro (numa caracterização obviamente copiada de Os Supremos).

Em The Ultimates, a ligação entre quadrinhos e cinema vai além dos comentários sobre o elenco de um suposto filme ou as referências a atores como Brad Pitt ou Johnny Depp. Uma das melhores sequências de ação da HQ, quando Viúva Negra e Gavião Arqueiro invadem os escritórios dos alienígenas, foi clara e declaradamente inspirada no filme Matrix, então lançado há poucos anos e ainda uma sensação (antes de ser avacalhado por suas tolas e dispensáveis continuações). Mais significativamente e num sentido inverso, a série de Millar e Hitch tem servido de modelo para concepções e cenas vistas nos filmes dos heróis Marvel. Notoriamente em O Incrível Hulk, que pegou emprestado a ligação entre os monstros e a fórmula do super-soldado, a quebradeira no centro de Nova York e a cena da transformação caindo de um helicóptero.

O sucesso comercial e o prestígio alcançados pela série garantiram uma continuação: The Ultimates 2 (que também teve treze edições, acompanhadas de um anual). Vieram em seguida diversas coletâneas em capa cartonada e em capa-dura, que culminaram numa omnibus editon (que reuniu as duas séries num volume de 880 páginas). Se não bastasse, a HQ também deu origem a dois filmes de animação, rebatizados nos Estados Unidos como Ultimate Avengers (e reintitulados no Brasil como Os Supremos – O Filme e Os Supremos 2). Houve ainda uma nova série The Ultimates 3, produzida por outros autores (sem a mesma qualidade) e mais recentemente foram lançadas Ultimate Comics: New Ultimates e Ultimate Comics: Avengers (esta última escrita por Millar).

Se tivessem produzido apenas os primeiros capítulos de The Ultimates, Mark Millar e Bryan Hitch já teriam criado a melhor série de super-heróis da década (além de oferecer um “mapa da mina” para os filmes da Marvel). Desde O Cavaleiro das Trevas e Watchmen em meados dos anos 80, nenhuma outra HQ de super-heróis havia conseguido articular tão bem a narrativa ficcional com uma representação do ambiente político e cultural. E nenhuma outra recriação de antigos heróis havia conseguido escapar à sombra de Miracleman. Idealizada como um filme de orçamento milionário, The Ultimates provou que ainda é possível criar revistas de super-heróis inovadoras. Uma série brilhante e contemporânea que, com ótimos desenhos e narrativa, apresentou uma “versão definitiva” para os antigos heróis Marvel. Em resumo, um trabalho imperdível!

18/07/2010

The Ultimates, a melhor série de super-heróis da década (I).


No ano 2000, com a indicação de Joe Quesada para o cargo de editor-chefe e a crescente interligação dos quadrinhos com outras mídias, a Marvel deu início à ascensão que a faria líder do mercado de revistas nos Estados Unidos. Grande parte do sucesso alcançado nos últimos dez anos se deve a uma política de valorização dos autores, a um bom planejamento das revistas e coletâneas, bem como ao interesse trazido pelos filmes de Hollywood. E talvez em nenhum outro caso a articulação entre trabalho autoral de qualidade e estratégia editorial inteligente tenha sido tão bem-sucedida quanto com The Ultimates. Criada entre 2002 e 2004 pelo roteirista escocês Mark Millar e pelo desenhista inglês Bryan Hitch (com arte-final por Andrew Currie e Paul Neary, cores por Paul Mounts), essa HQ na certa merece o título de melhor série de super-heróis da década.

Pertencendo à linha alternativa que apresentou versões atualizadas dos personagens Marvel, Os Supremos (como a equipe foi rebatizada no Brasil) é a versão Ultimate (“definitiva”) dos Vingadores. No elenco inicial estão os heróis tradicionais do grupo: Homem de Ferro, Thor, Gigante e Vespa, com a participação do Hulk e a liderança do Capitão América. Mas, diferente da história original com os Vingadores, não é o acaso e o plano maléfico de um supervilão que reúnem os heróis, originando o supergrupo. No caso de Os Supremos, é uma iniciativa da S.H.I.E.L.D. e de seu diretor, Nick Fury, o que leva a essa união (já que, para enfrentar ameaças envolvendo superpoderes, nada mais adequado que uma equipe de super-humanos). Contudo, o que na teoria parece uma solução simples acaba se mostrando algo um tanto complicado na prática.

Divergindo em interesses, intenções e personalidades, Os Supremos formam um grupo bastante heterogêneo, que tem em Nick Fury seu ponto de equilíbrio. Há o Homem de Ferro, sempre servido de um drinque e às voltas com as peculiaridades de sua vida de playboy multimilionário. Há o Thor, que oscila entre a figura de um líder pacifista contestador e a do deus nórdico superpoderoso e implacável. Temos ainda o casal Gigante e Vespa, cuja cumplicidade e aparente harmonia explodem num episódio de violência doméstica. Ou o atormentado e inseguro Bruce Banner, que para se sentir parte do grupo acaba libertando o destrutivo Hulk. E temos, por fim, o patriótico Capitão América, inspiração heroica para Os Supremos, que ressurge do passado para encontrar um mundo bem diferente do que deixara em 1945.

Um “Incidente Hulk” (que deixa centenas de vítimas) e um conflito interno (que produz muita publicidade ruim) são algumas das situações que Os Supremos têm que enfrentar. Mas o verdadeiro desafio para o grupo de heróis remonta aos tempos da Segunda Guerra, tendo uma origem extraterrestre. Entram em cena então as versões Ultimate de Viúva Negra, Gavião Arqueiro, Feiticeira Escarlate e Mercúrio, que formam uma unidade secreta a serviço da S.H.I.E.L.D. Em meio à invasão em massa dos Chitauri (a versão Ultimate dos Skrulls), Capitão América, Homem de Ferro, Thor, Nick Fury & Cia. acabam tendo que contar com uma ajudinha do integrante menos popular do grupo, o incontrolável Hulk. Ao final, a ameaça alienígena é derrotada, mas quem sai mesmo ganhando é o leitor, que acaba de ler uma ótima HQ de super-heróis.

(CONTINUA - é claro!)

12/07/2010

SOLAR na Mundo dos Super-Heróis!


Na edição mais recente da revista Mundo dos Super-Heróis, saiu uma elogiosa matéria sobre a SOLAR. O pessoal da revista acertou em cheio com o título “Inimigo dos clichês de super-heróis”, pois fugir aos lugares-comuns dos quadrinhos comerciais foi realmente um dos objetivos deste trabalho. Para quem não conferiu na edição impressa, fica aqui uma reprodução da matéria, com meus agradecimentos ao pessoal da Mundo dos Super-Heróis pela divulgação do trabalho.

Criado em 1994 e publicado em sua versão original entre 1996 e 1998, Solar começou a ser reformulado em 2004, tendo sido relançado em 2009 nas edições SOLAR: Renascimento e SOLAR: Solo Sagrado. Quem ficou interessado e ainda não conhece as histórias desse herói brasileiro com poderes xamanísticos, as revistas podem ser adquiridas diretamente comigo ou através do link na capinha reproduzida na coluna ao lado. Várias outras informações sobre o personagem e prévias das revistas podem ser conferidas clicando no marcador SOLAR logo abaixo.

Urbanoide na campanha por um trânsito mais tranquilo!


Já está circulando o sexto e último número da série Pratique Gentileza, que produzimos para a Rádio Itatiaia / Fiat / Unimed-BH. A HQ é uma criação minha, com desenhos de Luhan Dias e cores de Cleber Campos. Nesta edição final, nosso “robô gentil” tem que ajudar a desatar “O nó do trânsito” e aproveita para dar dicas importantes de como termos ambientes urbanos mais tranquilos e saudáveis.

Como devem ter percebido, a inspiração inicial para a ilustração nesta postagem foi a capa do famoso disco Abbey Road dos Beatles. Uma nota interessante é que, embora seja a última HQ do Urbanoide a ser publicada, esta foi na verdade a primeira a ser produzida, há exatamente um ano.

Os exemplares da revista serão distribuídos em escolas, universidades e eventos promocionais.

11/07/2010

Rayos y Centellas: super-heróis retrô, numa minissérie espanhola.


No ano passado, ao visitar um dos blogs do amigo Ismael Marfull, deparei com uma postagem sobre “Os Super-Heróis Republicanos”. O título chamou minha atenção, mas o que me conquistou mesmo foram as imagens que ilustram a postagem, com capas e páginas desenhadas num interessantíssimo estilo cartunizado. Ao ler o texto, logo me lembrei da série Marvelman e da minissérie 1963, com as quais Alan Moore inaugurou, respectivamente, as recriações metalinguísticas de antigos super-heróis e o subgênero dos super-heróis retrô. Apesar da clara influência dos trabalhos do roteirista inglês, pelo texto de Ismael já se podia perceber que Rayos y Centellas tinha suas qualidades próprias.

E não são poucas! A começar pelo título, que deve ser o nome de grupo de super-heróis mais lírico que já inventaram. Pedi então a Ismael para ver se me conseguia as três edições da minissérie e, passados alguns meses, recebi as revistas, junto com outros tebeos (no mesmo pacote que trouxe a adaptação de O Médico e o Monstro da qual já falei aqui). Lançada em 1996, Rayos y Centellas é uma criação do roteirista David Muñoz e do desenhista Luis Bustos. A HQ traz as aventuras e desventuras de um grupo de heróis, cujas histórias se passam em 1957, numa realidade alternativa em que os republicanos venceram a Guerra Civil Espanhola e o general Franco morreu.

Embora a primeira edição seja um pouco confusa, com saltos narrativos e uma grafia nos balões por vezes difícil de entender, a história é criativa e engraçada, o visual dinâmico e expressivo. Nos dois capítulos seguintes, aqueles problemas são superados e a HQ avança através de viagens a dimensões paralelas e também ao passado (aliás, esta singela minissérie espanhola já empregava elementos que fariam o sucesso da série Tom Strong e do seriado Lost). Se não bastasse, um robô que leva o cérebro de Franco, um atrapalhado vilão ao estilo de Dick Vigarista, alienígenas cabeçudos, dinossauros, traidores e brigadas fascistas entram em cena para tentar eliminar os Rayos y Centellas.

Ao final, tudo dá errado e Dr. Felicidad, Protón, Boris Bovril, Divisor, Sísmica e Juanra não conseguem salvar o planeta... No entanto, através de uma surpreendente reviravolta narrativa, o roteirista nos mostra que seus heróis, sem sequer suspeitar, alteraram o passado e, consequentemente, deram início a uma nova linha do tempo na qual tudo acaba bem (ao menos enquanto seus inimigos não atacarem novamente!). E se o roteiro é inteligente e criativo, por si sós os expressivos desenhos já valeriam a HQ. Numa linha cartunizada, as páginas da minissérie lembram a recriação pop feita pelo norte-americano Jay Stephens na série Land of Nod ou pelo brasileiro Will em Sideralman.

Empregando com precisão os contrastes entre preto e branco, o traço varia de intensidade, dando leveza ou peso às cenas e personagens, de acordo com o que pede a história. Se não bastasse, seguindo o que se vê nas edições de 1963, a minissérie espanhola também traz editoriais, anúncios publicitários e seções de cartas fictícios (que buscam reforçar o clima pop e retrô das histórias). Infelizmente, a qualidade e a inovação trazidas por este trabalho de Muñoz e Bustos parece não ter feito o sucesso necessário entre os leitores espanhóis da época, não tendo assim uma continuação. Uma pena! De qualquer forma, esse trabalho mereceria uma reedição e na certa uma edição brasileira.

Rayos y Centellas é uma história em quadrinhos divertida, cheia de referências e lugares-comuns saídos de desenhos animados e seriados de ficção científica clássicos. Como não se render a super-heróis esquisitões, com seus inimigos de bigodinho prussiano e risinho irritante, ou formas de robô fora de moda? Ainda assim, com uma história inteligente, desenhos deliciosos e uma narrativa (quase sempre) eficiente, essa HQ espanhola subverte as fórmulas do gênero. Mas, mais que brincar com clichês e lugares-comuns, mais que repetir a eterna luta entre “o bem e o mal”, o trabalho de Muñoz e Bustos nos fala de uma disputa mais real e histórica: aquela entre as forças do fascismo e da liberdade.

Lançada em março de 1996, exatamente quando eu publicava por aqui o primeiro número da série Solar, essa minissérie espanhola foi uma das muitas tentativas de se criar quadrinhos de super-heróis autóctones, inspirando-se na genialidade do mestre Alan Moore, mas buscando um caminho próprio, autoral e nacional. Um exemplo a ser seguido e multiplicado!

08/07/2010

1963: uma série que marcou época e virou história (II).


Reunindo uma equipe renomada que, além de Steve Bissette e Rick Veitch, contava com Dave Gibbons e John Totleben, entre outros, 1963 estreou com estardalhaço. Quando chegaram às lojas em 1993, Mystery Incorporated, The Fury, Tales of the Uncanny, Tales from Beyond, Horus e Tomorrow Syndicate traziam de fato algo que, se não era exatamente “novo”, era na certa inovador. Com personagens inspirados nos heróis Marvel tradicionais (Quarteto Fantástico, Hulk, Homem-Aranha, Thor, etc.), as revistas imitavam os estilos de desenho, diagramação e colorização dos anos 60 (proposta criativa que seria repetida com perfeição na revista Tomorrow Stories Special n°2); a imitação era tão completa que Moore produziu editoriais, seções de cartas e até anúncios publicitários de época (neste caso antecipando o que faria em 1999 na minissérie The League of Extraordinary Gentleman).

O fato é que toda a concepção de 1963, da criação à edição, tinha como modelo as revistas clássicas criadas por Stan Lee, Jack Kirby, Steve Ditko & Cia. Deixando de lado seus roteiros extensos e absurdamente detalhados, o “Afável Al Moore” se inspirou no chamado “Método Marvel”, escrevendo apenas indicações gerais para os desenhistas e trabalhando os diálogos após as páginas serem desenhadas. Mas, para muitos, a imitação do tom bombástico dos editoriais dos anos 60 e mesmo a forma pomposa como os nomes dos autores aparecem nos créditos das HQs, resultou mais numa autopromoção de Moore, do que propriamente numa homenagem aos quadrinhos clássicos. Chamadas às vezes de pastiches dos quadrinhos da Marvel, as seis edições da minissérie variam em qualidade, algumas aproximando-se mais, outras menos, da proposta estética que as originou.

Desenhada por Veitch e arte-finalizada por Gibbons, Mystery Incorporated sustenta-se como uma boa releitura do Quarteto Fantástico (apesar das similaridades com a revista Doom Patrol n°53, criada por Grant Morrison e Ken Steacy um ano antes). Maior destaque vai para o traço “Steve Ditko” da HQ com o personagem Hypernaut e o traço “Jack Kirby” da história com N-Man, ambas desenhadas por Bissette (para as revistas Tales of the Uncanny e Tales from Beyond, respectivamente). Pelo conjunto, a melhor revista é Horus – Lord of Light, que substituiu a mitologia nórdica do Thor da Marvel pela mitologia egípcia, num ótimo roteiro de Moore, desenhado por Veitch e Totleben. As demais histórias deixam a dever, embora a minissérie conte ainda com uma boa edição final, que reúne os diversos personagens e estabelece uma ponte para o “Universo Image” de 1993, anunciando o “Anual Gigante” que reuniria passado e presente.

Essa edição especial de oitenta páginas completaria a proposta estética de 1963, contrapondo os ingênuos heróis do “passado” aos violentos e sombrios personagens dos anos 90. Entretanto, as coisas começaram a dar errado e a já controversa minissérie acabou tendo um final tumultuado. Uma vez que envolveria os principais personagens da Image (Spawn, Wild C.A.Ts., Youngblod, etc.), o “Anual Gigante” precisaria contar com a participação de seus criadores (Todd McFarlane, Jim Lee, Rob Liefeld, entre outros), que na época já não se entendiam muito bem. Além disso, teria faltado empenho de Moore no final, uma vez que a minissérie já havia resolvido seus problemas financeiros e que o esperto Todd McFarlane o havia contratado (a peso de ouro, segundo consta) para produzir uma HQ do Spawn e em seguida as minisséries Violador e Feudo de Sangue (alguns dos piores trabalhos assinados pelo roteirista inglês).

Numa trajetória que envolveu disputas e trapaças, o “Anual Gigante” acabou não sendo realizado e, como efeito colateral, Moore rompeu seu contato com Bissette. Mais tarde, os direitos autorias sobre os personagens de 1963 foram divididos entre os três autores principais, num acordo que inviabilizaria a republicação da minissérie (até o momento). Mas, apesar dos problemas e controvérsias, a incompleta minissérie cumpriu seu papel, inaugurando o subgênero das revistas de super-heróis retrô e das recriações metalinguísticas (linha seguida pelo próprio Moore na sua brilhante fase à frente da série Supremo, que transformou um plágio do Super-Homem numa homenagem metaficcional às HQs clássicas do herói). Muito comentada e imitada nas décadas que se seguiram, 1963 deu início a uma nova fase, em que os quadrinhos de super-heróis se voltaram ao passado para reencontrar seu caminho.

(Para quem quiser saber mais detalhes sobre os quadrinhos de Alan Moore e ler minha entrevista exclusiva com Steve Bissette, basta clicar nos marcadores abaixo.)

05/07/2010

1963: uma série que marcou época e virou história (I).


Entre 1984 e 1989, com as séries Monstro do Pântano, Watchmen e Miracleman, Alan Moore ajudou a revolucionar os quadrinhos de super-heróis. Mas, depois de muito sucesso e de uma aclamação pública poucas vezes vista por um autor de quadrinhos, ele decidiu se afastar das grandes editoras (principalmente devido aos problemas legais com a Marvel, em torno da utilização do nome Marvelman, e às desavenças contratuais com a DC Comics, acerca dos direitos de publicação de suas obras). Além disso, o roteirista jurou jamais voltar às HQs de super-heróis, que considerava então um gênero esgotado. A partir daí, ele passou a se dedicar a trabalhos mais autorais e pessoais, como as histórias em capítulos para a publicação independente Taboo (na qual surgiram From Hell e Lost Girls) e graphic novels especiais (como Brought to Light e A Small Killing).

Aproveitando o renome internacional e estimulado por outros editores independentes (como Dave Sim da série Cerebus), Moore decidiu montar sua própria editora. Nascia então a Mad Love, na qual o roteirista tinha como sócias sua esposa, Phyllis, e a namorada dos dois, Debbie. Pela editora, eles lançaram a revista especial AARGH (“Artistas Contra Agressiva Homofobia Governamental”), coletânea destinada a angariar recursos para serem usados contra uma proposta de lei do governo Margaret Thatcher. Em seguida, veio a série Big Numbers que contava com a fantástica arte de Bill Sienkiewicz, mas que enfrentou imensos (e ainda misteriosos) problemas, sendo interrompida em seu segundo número. Toda a confusão envolvida na interrupção de Big Numbers levou não apenas ao rompimento entre Moore e Sienkiewicz, mas também ao fim de seu casamento a três e à falência de sua editora.

Enfrentando problemas pessoais e financeiros, o roteirista não teve muita escolha, a não ser voltar atrás com sua palavra, retornando ao gênero dos super-heróis. Era 1992 e, na época, a Image Comics representava uma alternativa às gigantes do mercado norte-americano (Marvel e DC Comics), além de ser uma promessa de liberdade criativa (ou mesmo de dinheiro fácil). O primeiro contrato assinado por Moore com a nova editora foi a controversa minissérie 1963 (que também ficaria inacabada e levaria a outro rompimento pessoal). Tudo começou com o convite do quadrinista Jim Valentino para que Moore escrevesse uma edição de sua série Shadowhawk (um dos muitos clones do Wolverine surgidos na época). Moore não se interessou pelo trabalho, mas como contraproposta apresentou, junto com os desenhistas Steve Bissette e Rick Veitch, a proposta para o que viria ser a minissérie 1963.

Toda a concepção desse projeto não pode ser separada do histórico pessoal e do momento que Moore vivia. Tendo rompido “definitivamente” com a Marvel e a DC, o roteirista viu na Image a chance de retornar às lucrativas HQs de super-heróis, sem ter que se associar novamente àquelas editoras. Além disso, ele estava muito descontente com o efeito negativo que suas obras tiveram sobre as revistas de super-heróis, que se tornavam então cada vez mais violentas e cínicas. Assim, embora considerasse que havia feito sua “declaração final” sobre os super-heróis em Watchmen e Miracleman: Olympus, o projeto para a Image tornou-se uma forma de contribuir com a nova editora na disputa contra as duas gigantes do mercado e, ao mesmo tempo, de combater os efeitos negativos do “realismo” dos anos 80. A resposta criativa de Moore veio na forma de seis edições inspiradas nos quadrinhos Marvel do início dos anos 60.

(CONTINUA)

01/07/2010

Curso de Quadrinhos em BH.

Desde 2004 tenho coordenado o Curso de Quadrinhos no Centro Cultural UFMG, em Belo Horizonte (MG). A proposta do curso é apresentar aos alunos os principais elementos da arte dos quadrinhos, possibilitando que eles desenvolvam suas próprias criações. Voltado a pessoas que queiram se iniciar ou conhecer melhor essa fascinante arte, o curso tem duração de 4 meses e os alunos recebem uma apostila com o resumo do conteúdo. Partindo de aulas expositivas amplamente ilustradas sobre a origem histórica, a linguagem e os principais artistas dos quadrinhos, o curso traz em seguida noções básicas de desenho de objetos, personagens e cenários. Estas aulas iniciais servem de base para a segunda parte, na qual acompanho os alunos na produção de suas próprias histórias em quadrinhos, que ao final são reunidas num fanzine. (Para conhecer trabalhos de ex-alunos do curso, clique no marcador Curso de Quadrinhos logo abaixo.)