25/12/2008

1993, um ano ímpar!


1993, que ano para os quadrinhos! Um furacão chamado Image Comics virava de cabeça para baixo o mercado norte-americano, varrendo antigos tabus editoriais e abalando as estruturas das gigantes Marvel e DC Comics. Em seu segundo ano de atividades, a editora de Spawn, Wild C.A.T.s e Youngblood alcançava vendas astronômicas e abria espaço para criações mais interessantes, como a série The Maxx de Sam Kieth e a minissérie 1963 escrita por Alan Moore.

E as lições mercadológicas dadas por Todd McFarlane, Jim Lee, Rob Liefeld & Cia. não passaram despercebidas. Afinal, por que criar personagens para as grandes editoras, quando se pode trabalhar em cooperativa e manter os direitos autorais sobre suas criações? Foi seguindo essa idéia que surgiram Sin City, Hellboy e Madman, entre outras séries produzidas por Frank Miller, Mike Mignola, Michael Allred e mais alguns medalhões do mercado, que se uniram para criar o selo Legend, com HQs editadas pela Dark Horse Comics.

É claro que o ano de 1993 não teria sido o mesmo sem outro selo editorial: o Vertigo. Inspirados pelo sucesso comercial e pela aclamação crítica da série The Sandman, os executivos da DC Comics viram uma ótima oportunidade para uma nova linha de “quadrinhos adultos”. Capitaneada pela editora Karen Berger, tendo como fundamento as inovações trazidas nos anos 80 pelo inglês Alan Moore e espelhando-se nas concepções criativas do também inglês Neil Gaiman, o selo Vertigo contribuiu para reforçar a idéia de que os quadrinhos não são apenas “coisa de criança”.

Enquanto isso, no Brasil, ainda se faziam sentir as ondas da “revolução das graphic novels” da segunda metade dos anos 80. Mas, se as Bienais do Rio trouxeram a nossas praias grandes nomes dos quadrinhos internacionais, o mercado nacional continuava uma realidade distante para a maioria dos quadrinistas brasileiros. Exceto pelas revistas produzidas pelos Estúdios Maurício de Sousa e por algumas experiências esporádicas, encontrar publicações com personagens nacionais era algo raro (e as coisas não mudaram muito nos últimos quinze anos). Sem um espaço garantido no mercado, os quadrinistas brasileiros tiveram que inventar seu próprio caminho.

Em 1993, uma das trilhas mais usadas era o circuito dos fanzines e edições alternativas. Foi em março daquele ano que lancei minha primeira publicação: um fanzine em xérox e formato ofício, com quadrinhos e matérias, feito em parceria com o desenhista Erick Azevedo. Era o artesanal Replicantes, que teve apenas dois números, o primeiro em março daquele ano e o segundo em junho do ano seguinte. Apesar de suas limitações e até mesmo precariedade, essa primeira experiência editorial despertou em mim o gosto por publicar meus quadrinhos (o que eu voltaria a fazer em 1995 com o fanzine Ideário e nos anos seguintes com as revistas Solar e Caliban).

Em 1993, porém, já havia autores independentes publicando suas HQs não mais em xérox e sim com impressão gráfica profissional e na forma de revistas. Um grupo desses autores, no Rio de Janeiro, chegou a formar a “Frente das Revistas Independentes”. Entre as publicações que faziam parte da FRI, destacava-se a antologia Grimoire. Lançada em novembro daquele ano, editada por Thais Linhares e Bernard, a revista trazia quatro histórias de fantasia com ótimos desenhos, além de uma introdução, biografias dos autores e uma matéria sobre os quadrinhos de Neil Gaiman (tudo impresso com papel de qualidade, capa em duas cores e miolo em P&B).

Descobri a Grimore já em 1994, numa bancada de revistas nacionais e importadas que o gerente Carlos e o responsável pelos quadrinhos Evandro mantinham na entrada da livraria Leitura Savassi (em Belo Horizonte, MG). Naquele dia não sei se cheguei a comprar algum exemplar do Sandman da editora Globo ou de Books of Magic da DC/Vertigo (revistas que eu colecionava época). O que sei com certeza é que não deixei passar um exemplar de Grimoire, que é hoje um dos tesouros de minha coleção (e cuja capa, é claro, ilustra esta postagem). Na época, essa bela revista independente mostrou a mim e a outros aspirantes a editor que era possível produzir e publicar nossos quadrinhos com qualidade profissional.

A verdade é que éramos pura empolgação e paixão pelos quadrinhos e à nossa frente só víamos possibilidades abertas. Talvez tudo isso fosse um pouco de ilusão juvenil, estimulada pela agitação e pelas novidades de 1993, um ano certamente ímpar!

6 comentários:

Ariane Rodrigues disse...

Imparmente, ao invés de impar-se na Ceia de Natal, escrevias sobre um certo ano ímpar; eu, aqui, teimo em impar-me com a tua pena que não cansa, criança...

A meu ver, os melhores anos são ímpares!

Wellington Srbek disse...

Olá Ariane! Na verdade, o texto já estava escrito desde antes. Ontem eu estava aqui, plural, a comemorar o Natal. Uma taça na mão e algum vinho na cabeça...
Mas realmente escrever e amar são minha vida, são o que peço e quero da vida. Quando não tenho um, mergulho de vez no outro.
Foi o que fiz no início deste mês, deixando todas as postagens de dezembro escritas e preparadas para chegarem a vocês (ainda falta uma última!).
Sobre os anos pares ou ímpares, na minha experiência, anos ímpares também podem ser ruins, como foi 2007.
Mas de 2009 só espero coisas boas.
Ciao!

Anônimo disse...

Tenho o(s) Grimoire(s) - na época do lançamento, por acaso, estava em São Paulo (morava em Bagé/RS nesse tempo, se não estou enganado). Admito que caí para trás quando o vi. Comprei tudo da FRI. Chegava a ficar assustado: o país está mudando. Infelizemnte não vingou. Algo parecido acontece hoje... espero que vingue.

Wellington Srbek disse...

Quando diz o(s) Grimoire(s), acho que você está se referindo aos fanzines que a Thais lançou, não é?
Também acho que comprei tudo da FRI ou que tinha alguma relação com o movimento deles, como a Quadrinhos Tristes, a Nonô Jacaré, a nova Spectro e a Hotel do Terror.
Acho que hoje a situação é diferente, há mais possibilidades de divulgação com a Internet e uma estrutura maior com o Quarto Mundo, do que havia na época da FRI no Rio e do Estúdio HQ aqui em BH. Mas vamos ver no que dá!
Abraço DS e até a próxima!

Wsk disse...

Caramba fikei total nostalgico agora, apesar de um pouco novo 24 anos agora, tenho essa revista desde a epoca de lançamento, acho q minha mae conhecia alguem relacionada a revista (vou pesquisar e falo o q descobri), mas fui presenteado com ela e ate hj eh uma das minhas ediçoes preferidas na minha coleçao! Aconselho a todos e fico feliz de nao ser o unico q sabe da existencia dela! Vlw

Wellington Srbek disse...

Pois é, Grimoire é uma verdadeira joia e é bacana saber que alguém compartilha dessa opinião.
Abraços!