10/11/2008
Os 20 anos de Sandman!
Em meados dos anos 80, com o sucesso do roteirista inglês Alan Moore à frente da revista Swamp Thing (Monstro do Pântano), a DC Comics decidiu “sair à caça” de outros roteiristas da Grã-Bretanha. Mais cultos e não tendo os vícios de seus colegas norte-americanos, os autores britânicos iniciaram então uma revolução qualitativa no mercado de quadrinhos. Um dos primeiros frutos da chamada “invasão britânica” foi a minissérie Orquídea Negra, lançada em 1988, com roteiro de Neil Gaiman e páginas pintadas por Dave McKean. O competente trabalho da dupla abriu as portas para um novo projeto: The Sandman. Uma mistura de realidade e ficção, terror e fantasia, a revista surgida há vinte anos é centrada na figura de Morpheus, o Mestre dos Sonhos, uma entidade que personifica os sonhos e o ato de sonhar.
Lançada em fins de 1988 e concluída no início de 1996, The Sandman foi uma das melhores séries de quadrinhos já produzidas. O nome de seu protagonista já havia sido utilizado em dois outros heróis da DC Comics nos anos 40 e 70, mas a versão de Neil Gaiman para os anos 80 e 90 partia de uma concepção completamente nova. Reunindo referências à literatura, filosofia, história, mitologia e aos quadrinhos, o roteirista construiu todo um universo ficcional, do qual fazem parte também personagens históricos (como William Shakespeare, Robespierre, Harun Al Rashid e Marco Polo). Muito premiada durante sua publicação, o prestígio da obra só fez aumentar após seu encerramento, projetando internacionalmente o nome de seu criador. Merecem também destaque especial as belas e às vezes estranhas capas criadas por Dave McKean (geralmente pinturas, colagens ou fotomontagens).
Um fator marcante nas primeiras edições da série é a influência dos roteiros de Alan Moore para o Monstro do Pântano. Aliás, Gaiman cita o nome de seu precursor logo nos primeiros parágrafos da “Proposta para [a publicação de] Sandman”, um extenso texto acompanhado de estudos para o visual do Mestre dos Sonhos (publicado pela primeira vez em The Absolute Sandman Volume1). Nele, Gaiman apresenta detalhadamente os fundamentos de sua concepção para o personagem e os principais coadjuvantes e ambientes da série, bem como a correlação com versões anteriores de Sandman e as sinopses de nove capítulos. Chama atenção não só o quanto da série já estava esboçado em seu nascimento, mas também alguns elementos que foram alterados ao longo do caminho (por exemplo, parece que inicialmente Gaiman havia imaginado os Perpétuos não como sete irmãos, e sim como uma tríade formada por Sonho, Morte e Destino).
Sucesso de público e de crítica, The Sandman foi a primeira série da DC Comics a ser inteiramente reeditada em forma de livro. Além disso, sua popularidade motivou a editora a investir em uma nova linha de “quadrinhos com temática adulta”: o selo Vertigo, lançado em 1993. E pode-se dizer que tudo isso se deveu quase exclusivamente aos roteiros de Gaiman. Afinal, até mesmo os fãs mais ardorosos do Mestre dos Sonhos têm de reconhecer que algumas edições da revista trouxeram desenhos de baixíssima qualidade (que chegam a prejudicá-la, quando consideramos a obra como um todo). É importante lembrarmos que o que define uma HQ de qualidade é o conjunto formado por uma boa história, contada com um ritmo narrativo e um visual adequados. E a verdade é que esse conjunto qualitativo, em vários momentos, não esteve presente nas páginas de The Sandman (particularmente nos arcos "Casa de Bonecas” e “Um jogo de você”).
As deficiências nos desenhos não impediram, contudo, que a revista alcançasse um prestígio nunca antes visto nos quadrinhos norte-americanos (o qual por vezes chega a ser um tanto exagerado). Somando setenta e cinco números, um especial (Sandman: Orpheus), HQs curtas e galerias de ilustrações, a série também deu origem a um livro ilustrado (Sandman: Dream Hunters), uma graphic novel campeã de vendas (Sandman: Endless Nights) e duas minisséries (com a Morte), além de novas revistas periódicas, escritas por outros roteiristas, mas inspiradas nos conceitos e personagens de Gaiman (como The Dreaming e Sandman Presents). Em 2007, a DC Comics deu início à belíssima coleção The Absolute Sandman, em quatro volumes com estojo, formato estendido, capa-dura em imitação de couro, papel de alta qualidade, vários extras com ilustrações e textos especiais, além da recolorização dos primeiros trinta e oito capítulos (do capítulo 39 em diante a colorização não precisou ser refeita).
No Brasil, Sandman já passou por duas coleções completas: a primeira e mais fiel à revista original lançada pela Globo em 1989, e a luxuosa reedição estendida, com capa-dura e em dez volumes, lançada nos últimos anos pela Conrad (sem contar aqui a inacabada e péssima reimpressão pela Brainstore). Para aqueles que não puderam acompanhar as edições anteriores, inicia-se agora uma nova coleção de Sandman, desta vez pela Pixel, que optou por um formato e uma organização inéditos. Serão ao todo dezessete volumes (reunindo os setenta e cinco números da revista e incluindo Sandman: Orpheus), seguidos de três especiais (O Mundo de Sandman, Noites Sem-Fim e Caçadores de Sonhos). A Pixel utilizará as versões recolorizadas e também os principais conteúdos extras de The Absolute Sandman. Além disso, inteligentemente, os editores brasileiros decidiram incorporar à sua coleção os conteúdos do livro Capas na Areia, com as ilustrações das capas e os comentários de Gaiman e McKean.
Em meio a todo o sucesso e prestígio, The Sandman chegou ao fim, a pedido do próprio Gaiman (que declarou ter concluído a história que gostaria de contar). O roteirista então passou a se dedicar a edições especiais e, particularmente, a projetos em outras mídias, como cinema, tevê e literatura. Nos últimos anos, ele retornou aos quadrinhos em duas minisséries para a Marvel: 1602 e Eternals. Mas o fato é que nenhuma de suas obras mais recentes chegou aos pés da importância e repercussão de The Sandman, um marco nos quadrinhos norte-americanos, que assumiu a condição de clássico e continuará a habitar a imaginação de leitores por muitos e muitos anos. Enfim, só me resta desejar a Neil Gaiman, neste 10 de novembro, meus parabéns por sua obra-prima e um feliz aniversário!
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8 comentários:
Será que Sandman vira filme? Ou melhor um filme bom? Zack Snyder que nos ajude.
Valeu
Sinceramente, Queiroz, espero que não! O saldo das adaptações de quadrinhos para o cinema não é dos mais positivos.
Mas até que uma animação bem produzida, no estilo cartunizado do "Sandman: Kindly Ones", eu gostaria de ver.
Abraço!
Muito oportuno seu comentário sobre os fracos desenhos em algumas das histórias da série,Wellington.Coisa rara de se ver entre os espcialistas nessa área.
Já quanto à recente publicaçào da Pixel comprei o primeiro número levado pelo impulso do que o Preview da editora propunha na recolorizaçào.Mas decepcionei-me pois comparando com o material da Conrad chega às vezes a parecer brincadeira porque em páginas da ediçào desta editora aparecem as variaçòes de um tom de verde nas da Pixel eles se perdem; e em outros os amarelos,azuis e vermelhos ganham formas que na ediçào recente também se perderam.
Pena, mas mesmo assim torço pela continuidade da publicação pela Pixel do material do Sandman que apesar dos pesares merece.
Abs,
Zerramos
Interessante seu complemento, Zerramos. Eu não tenho a edição da Conrad para fazer a comparação, mas o que posso dizer é que, na The Absolute Sandman, as novas cores fazem alguma diferença. Na edição da Pixel, talvez o formato tenha prejudicado as tonalidades e a separação das cores.
Para quem tem a coleção da Conrad, realmente não vale a pena adquirir a da Pixel (apesar dos extras interessantes, como a proposta de publicação de Sandman e as versões a lápis de algumas HQs que virão pela frente). Para quem tem as revistas da Globo (e algum dinheiro sobrando), pode ser até um caso a se pensar. E para quem não tem nenhuma das duas, será uma oportunidade imperdível de conhecer uma ótima série de quadrinhos.
Abraço!
Não conheço esse personagens elogiado por todos, tenho muita vontade, mas minha desconfiança é parecer com O Constantine(hellblazer) , o qual comprei uma revista e não gostei nem um pouco!
Mas vou adquirir e volto no topico!
vlw.
Olá J.J.
Os personagens em si, não têm nada a ver um com o outro (embora as duas séries tenham nascido do estilo de quadrinho de terror que o Alan Moore implantou no mercado norte-americano com as HQs do Monstro do Pântano). A ambientação das histórias, principalmente nas vinte primeiras edições de Sandman, assemelha-se à das histórias do Constantine. Mas depois Sandman se torna uma HQ mais mítica e literária, mais fantasia do que terror. Resta dizer que esses dois personagens foram a base do selo Vertigo, ditando a temática de outras séries que apareceram depois (como Preacher e Fábulas).
Mas não deixe de ler Sandman! É meio como Promethea: se você não gostar, o problema não está no quadrinho.
Abraço!
Olha, se mesmo assim, depois do texto do Srbek, Sandman não os motivar a ler, eu tenho uma boa motivação, pelo menos pro publico masculino: é a revista em quadrinhos com mais GAROTAS LEITORAS por metro quadrado que se tem noticia.
São por esse fato Neil Gaiman já merece uma estatua!
=D
Eh, bem lembrado, Marcus!
Sandman é uma boa opção de presente para garotas interessantes e inteligentes.
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