22/11/2007

Recriando "lendas" dos quadrinhos.


Nos anos que se seguiram à publicação de Crise nas Infinitas Terras, a editora DC Comics investiu em novas séries e edições especiais, cujo objetivo era recontar a origem de seus principais heróis. O resultado foram trabalhos de qualidade, que ajudaram a dar vida nova a verdadeiras "lendas" dos quadrinhos.

Super-Homem foi o primeiro e mais popular dos super-heróis. Desde que apareceu em 1938, o Homem de Aço enfrentou todo o tipo de vilões e ameaças: de maléficos nazistas a monstros alienígenas, passando por andróides enlouquecidos e meteoritos radioativos. Mas nem o maior super-herói da DC ficou imune à tendência racionalista dos anos 80. Era preciso tornar o Super-Homem mais verossímil, encontrar explicações para seus poderes e amadurecer seu relacionamento com Lois Lane.

A tarefa ficou a cargo de John Byrne que, com a minissérie The Man of Steel, não só recontou a origem do personagem, mas estabeleceu limites para seus poderes e fraquezas. Nas histórias de Byrne, lançadas em 1986, Clark Kent ganhou uma maior autonomia e personagens como Lex Luthor e Lois Lane tornaram-se algo mais que clichês do “vilão cientista maléfico e louco” e da “linda mocinha a ser salva”. Em outras palavras, Byrne tornou o Super-Homem um personagem atualizado e adaptado ao ambiente e público da época. E ele foi apenas o primeiro da lista!

Com as HQs que criou para o Demolidor no início da década de 1980, Frank Miller tornou-se o desenhista mais inovador dos quadrinhos norte-americanos. Quando a DC resolveu reagir à perda de mercado, apostando em novos projetos, Miller recebeu sinal-verde para produzir Ronin, HQ-laboratório em que ele testou estilos, técnicas e influências. Em seguida veio O Cavaleiro das Trevas: uma das HQs mais impactantes e influentes da história dos quadrinhos norte-americanos. Seguindo o sucesso desta série, Miller foi contratado para recontar a origem do Homem-Morcego, produzindo em 1987 a excelente Batman: Ano Um, feita em parceria com o desenhista David Mazzucchelli.

Mais sombrio do que antes e atormentado pela morte de seus pais, Batman tornou-se o contraponto ideal para o Super-Homem (num antagonismo já presente em O Cavaleiro das Trevas). Por algum tempo, também Byrne e Miller foram identificados pelos leitores como a “luz” e as “trevas” nos quadrinhos de super-heróis, numa percepção alimentada pelos editores (embora talvez seja mais correto dizer, como bem resumiu um amigo, que: “Byrne nos fazia entrar para os quadrinhos, mas era Miller que nos mantinha lá”). Inegavelmente, foram O Cavaleiro das Trevas e Batman: Ano Um que fizeram do Homem-Morcego um personagem interessante e sério novamente (tarefa difícil, se levarmos em consideração a imagem jocosa que se associou a ele após o popular seriado de tevê dos anos 60).

Mesmo com Super-Homem e Batman ganhando uma vida novinha em folha, faltaria ainda a terceira personagem principal da DC Comics. Contudo, todos sabem que desenvolver histórias com super-heroínas não é algo muito fácil. Há obviamente uma tendência à erotização e até mesmo à ridicularização das personagens femininas. E isso se agrava se a super-mulher em questão nasceu numa ilha grega isolada do resto do mundo, mas enfrenta seus inimigos vestindo uma fantasia baseada na bandeira dos Estados Unidos. Assim, podemos dizer que o desenhista George Pérez, auxiliado pelos roteiristas Greg Potter e Len Wein, fez quase um milagre ao recontar a origem da Mulher-Maravilha.

Utilizando deuses e monstros da mitologia grega, os autores redefiniram a origem dos poderes da heroína e até arranjaram uma explicação para seu calção azul com estrelinhas brancas. Além disso, nos desenhos da nova série, Pérez pôde mostrar seu talento e cuidado com os detalhes, ao desenhar as divindades gregas e a arquitetura do próprio Olimpo (pessoalmente, posso dizer que ler aquelas HQs, repletas de deuses e referências mitológicas, aumentou meu interesse pelo campo da História, contribuindo para que alguns anos depois eu escolhesse esse curso na faculdade).

Na trilha do que Alan Moore fizera com Marvelman e Monstro do Pântano, a principal lição que o trabalho de Miller, Byrne e Pérez deixou para as HQs de super-heróis foi mostrar que a literatura, as artes em geral e a própria vida real podem e devem ser fontes de inspiração para os autores de quadrinhos. Tanto é que, com as reformulações de meados dos anos 80, a DC conseguiu reorganizar seu elenco de personagens, tornando-os atrativos para um público mais exigente e maduro. E este trabalho continuaria com outros personagens (como Gavião Negro, Aquaman e Homem-Animal), tendo um ponto central na minissérie Lendas, que contou com os desenhos de John Byrne e abriu caminho para a nova Liga da Justiça.

Infelizmente, nas inúmeras minisséries e edições especiais surgidas nos últimos anos, os temas introduzidos e as contribuições trazidas por aqueles trabalhos foram explorados à exaustão. A indústria dos comics, mais uma vez, não soube se livrar de seu maior defeito: a teimosia em transformar qualquer boa idéia numa “fórmula do sucesso” a ser repetida à exaustão. É claro que, para os antigos e novos leitores, há sempre a opção de rever aquelas ótimas histórias que recriaram alguns dos principais personagens dos quadrinhos.

5 comentários:

Anônimo disse...

Para quem gosta de quadrinhos vale o desenho.E este foi ficando cada vez melhor com o passar do tempo.Os filmes nem chegam perto.
Vim lá do http://patacoadasdokleber.blogspot.com que divulgou seu link.

Anônimo disse...

Perdoe-me.É Cleber com c e não k

Wellington Srbek disse...

Olá,
Na verdade, o endereço do blog do Cleber (que foi quem me ensinou como se monta um blog) é este:
http://patacoadas-do-cleber.blogspot.com/
Vale conferir!

Anônimo disse...

O Super-Homem do John Byrne trouxe outra importante mudança, pelo menos para o leitor brasileiro: o uso de Lois Lane para se referir à repórter, até então chamada de Miriam Lane por aqui. Pena, pena mesmo, que esse revival tenha durada apenas pouco mais de 20 anos. Na sociedade globalizada, o Super-Homem foi vítima de outras origens. Bons tempos...

Wellington Srbek disse...

Bem lembrado!
Mas pior do que as novas origens foi aquela bobagem editorial da "morte do Super-Homem", acompanhada da fase com o uniforme azul ao estilo Gen13.
Já a versão feita para Supermam Adventures, a revista baseada no desenho animado, foi bem legal. O roteirista era o Scott McCloud. Mas acho que isso não saiu no Brasil.