19/07/2009

Um artista brilhante de capa a capa: uma entrevista com Brian Bolland, parte1.


Sou capaz de comprar uma revista em quadrinhos simplesmente por ela ter uma capa desenhada por Brian Bolland. Mesmo! Tornei-me um fã desse brilhante artista britânico desde que vi seu trabalho pela primeira vez em A Piada Mortal, a marcante graphic novel do Batman e do Coringa escrita por Alan Moore. Em seguida vieram suas espetaculares capas para a revista Animal Man e outros trabalhos que o colocaram entre meus desenhistas favoritos dos quadrinhos. Nesta entrevista em três partes, Brian Bolland fala de seus primeiros trabalhos, suas histórias com Juiz Dredd, Camelot 3000, seus melhores trabalhos para a DC e muito mais. Espero que gostem!

Wellington Srbek: É realmente uma honra estar falando com o senhor! Vamos começar com uma pergunta biográfica: onde e quando nasceu e como a arte dos quadrinhos entrou em sua vida?

Brian Bolland: Em primeiro lugar, uma divulgaçãozinha do meu livro The Art of Brian Bolland, no qual respondo essa questão da forma mais completa e longa que eu possivelmente consigo. Então, resumindo: nasci em 26 de março de 1951 (no mesmo dia que o estimado desenhista José Luis García-Lopez e do biólogo e ateísta Richard Dawkins). Próximo à cidade inglesa de Boston (a Boston original, diga-se de passagem). Os quadrinhos norte-americanos começaram a ser importados para a Grã-Bretanha em 1959. Comecei a me interessar por eles em 1960-61, quando eu tinha dez anos. Comecei a desenhar minhas próprias versões amadorescas deles, mais ou menos na mesma época.

WS: O senhor tem uma formação em Artes e design gráfico, mas suas páginas e capas de quadrinhos mostram um profundo conhecimento e um verdadeiro amor por esta forma de arte. Que artistas de quadrinhos mais influenciaram sua visão e seu estilo?

BB: Eu passei cinco anos em diversas escolas de arte. Os quadrinhos não tinham ainda penetrado no ambiente das escolas de arte. Eu passei aquele tempo estudando toda a arte moderna e contemporânea. Parte dela eu gostava. Parte dela eu não gostava. Nunca fui muito bom com os Impressionistas. Quando ainda estava na escola de arte, eu gostava de Salvador Dali e René Magritte. Eu era impressionado com Ingres.

WS: Tenho dois ou três exemplares da reedição norte-americana da série Powerman que o senhor, Dave Gibbons e outros quadrinistas produziram para o mercado nigeriano. Acredito que esse foi seu primeiro trabalho pago com quadrinhos e também uma oportunidade para aprender o ofício de desenhista, certo?

BB: Está correto!

WS: Então vieram as histórias com o Juiz Dredd e as capas para a 2000 AD, que fizeram as pessoas realmente prestarem atenção em Brian Bolland. Como conseguiu esse trabalho e como era trabalhar na 2000 AD?

BB: Lá atrás, na segunda metade dos anos 60, havia os fanzines de quadrinhos. Pessoas como Dave Gibbons e meu amigo de perto de onde eu morava, Dave Harwood, eram atuantes neles. Em 1972, alguns de nós nos reunimos numa convenção de quadrinhos no Waverley Hotel em Londres. Em 1977, um dos meus amigos dos tempos de fanzinagem, Nick Landau, estava trabalhando como editor na 2000 AD e me pediu que desenhasse uma história do Juiz Dredd, substituindo um desenhista que tinha dado o fora. Eu tinha o mesmo agente que o Dave Gibbons (que foi quem nos conseguiu o trabalho em Powerman). Ele já tinha me conseguido trabalho em capas para a 2000 AD. Eu amava trabalhar na 2000 AD. Todas as pessoas envolvidas estavam entusiasmadas com esse novo personagem de sucesso. As histórias eram ótimas, e engraçadas. Nós estávamos impressionados com o trabalho de Mick McMahon. Infelizmente, a empresa que era a dona da 2000 AD não estava tratando muito bem os artistas freelance.

WS: Creio que o senhor foi o primeiro artista a trabalhar para o mercado norte-americano no que se costumou chamar de “a invasão britânica”. Por favor, conte a seus fãs brasileiros como isso aconteceu.

BB: Outro de meus amigos do universo dos fanzines era Richard Burton (não o ator!). Ele conhecia Paul Levitts, um outro ex-fanzineiro, de Nova York. Paul costumava publicar o The Comic Reader. Agora ele é uma figura importante na DC. Em 1979, Richard ouviu de Paul que o desenhista norte-americano Joe Staton iria a Londres para uma convenção e precisaria de uma mesa para trabalhar enquanto estivesse aqui. Ele desenhava a Green Lantern naquele tempo. Joe e sua esposa Hilarie vieram ficar conosco e eu assistia enquanto ele trabalhava na mesa de desenho de minha esposa, que ela não estava usando na época. Quando Joe soube que eu era um fã do Lanterna Verde desde que tinha dez anos, ele telefonou para seu editor, Jack C. Harris, e disse que estava no apartamento desse artista inglês e o que Jack achava de me deixar desenhar a capa daquela edição. Foi uma decisão arriscada da parte do Jack. Ele provavelmente havia visto meu trabalho em Juiz Dredd, que tinha sido visto apenas por uns poucos entusiastas nos Estados Unidos. Naquele tempo, antes das máquinas de fax ou dos e-mails ou dos computadores, parecia difícil trabalhar para o outro lado do Oceano Atlântico, então levou alguns anos até que resolvêssemos a logística da coisa.

WS: Camelot 3000 foi seu primeiro trabalho mais expressivo para a DC, e é também sua obra mais extensa. O que o senhor pode nos dizer sobre esta série em doze edições (agora graphic novel)?

BB: Bem, trabalho constante não veio da DC para mim logo de cara. Levou um tempo para eles descobrirem o que fazer comigo. Então o editor Len Wein e o roteirista Mike Barr tiveram a idéia para Camelot 3000. Fui escolhido para desenhá-la. Fui mandado numa viagem promocional para a San Diego Comic Convention e outros lugares. Eu nunca tinha sido tratado tão bem antes. Acho que aquela foi a primeira “maxissérie” impressa no padrão prestige, em papel de melhor qualidade que a usual.

A seguir: A Piada Mortal!

4 comentários:

Amalio Damas disse...

A vida tem algumas convergências interessantes.Se não fosse pelo Joe Stanton, seria necessário uma década ou duas para que Brian Bolland fosse descoberto, porque como ele mesmo frisou, era a época dos aparelhos de Telex. Alguém ainda lembra disso? Eu lembro porque já fui "operador de telex". Êêê véiera!

Wellington Srbek disse...

E quer ver mais uma convergência, Amalio?
Quando eu tinha uns 5 anos, ganhei (ou escolhi numa banca) uma revista da Ebal cheia de super-heróis na capa, com um número 100 desenhado ao fundo. A revista tinha desenhos muito legais e como eu era fã do desenho animado Superamigos, ela foi minha preferida durante muito tempo. Ainda tenho aqui aquele velho exemplar todo rabiscado de canetinha (porque eu gostava de "animar" as HQs, desenhando raios e campos de energia) e a convergência ou coincidência está no fato de que ela foi desenhada pelo Joe Staton. E outra coincidência é que essa HQ especial (que recentemente descobri ter saído da revista Showcase #100) traz Lanterna Verde, Flash, Adam Strange, Metal Men e outros heróis ao lado de personagens mais cômicos como os Inferior Five - os quais Grant Morrison resgatou nas páginas da série Animal Man (cujas capas foram desenhadas pelo Bolland), no famoso capítulo do Limbo dos Quadrinhos. E como essa história especial não inclui os 3 figurões da DC (Super-Homem, Batman e Mulher-Maravilha), olhando agora ela parece uma incrível antecipação da série 52 (co-escrita por Morrison).
Bom, depois de toda essa história, amigo Amalio, só posso repetir: Êêê véiera!

Caio Lima disse...

Ae! A tradução chegou... mais um grande artista que eu não conhecia... Mas tenho uma pergunta deste humilde padawan que escreve... O senhor lembra da Revista Crash? (uma revista informativa sobre quadrinhos e cultura pop) , é bem recente... mas pararam de fazê-la... o senhor sabe algo concreto sobre o fim da Crash?

Wellington Srbek disse...

Olá Caio,
Tudo beleza? Rapaz, desta revista Crash eu acho que só vi uma edição há muito, muito tempo. Essas revistas informativas de quadrinhos costumam ter vida curta no Brasil.
Bom, espero que esteja curtindo a entrevista, padawan virtual! Uma nova parte (em inglês) estará no ar na virada de hoje para amanhã. O tema: A Piada Mortal.
Abraços!