Segunda parte de nossa entrevista exclusiva, e David Lloyd fala sobre a criação e os significados da obra-prima V de Vingança, e também o que ele pensa da adaptação para o cinema produzida pelos irmãos Wachowski.
Wellington Srbek: É 1981 e o editor Dez Skinn está montando uma nova revista chamada Warrior. Você já tinha trabalhado para ele antes, e ele pede a você para criar uma nova série de aventura, similar a Night Raven. Então Alan Moore se junta ao projeto. Foi assim que V de Vingança nasceu, certo?
David Lloyd: Basicamente, sim. Dez inicialmente sugeriu que eu escrevesse e desenhasse a série - mas eu já tinha trabalhado com Alan em HQs do Doctor Who, gostei de trabalhar com ele e instintivamente sabia que podíamos criar algo muito bom se trabalhássemos em parceria. Alan já estava a bordo da Warrior com seu projeto de estimação de atualizar o Marvelman. V acabou se tornando uma combinação de dois conceitos que tínhamos bolado independentemente, mas que não tínhamos utilizado - um sobre uma guerrilha urbana feminina numa futura Inglaterra fascista, e outro sobre um assassino em série estranhamente vestido. O resultado final veio depois de muito brainstorm.
WS: A Inglaterra tem uma longa tradição em artes gráficas associadas à crítica política, desde um mestre como William Hogarth e um gênio como James Gillray a publicações como The Punch. Você vê V de Vingança como parte dessa tradição?
DL: Sim, certamente. Embora eu ache que a sutileza de V a tire da área da caricatura na qual a maioria da sátira política opera. Eu acho que o filme se aproxima mais daquele estilo de coisa, porque ele conta sua história em pinceladas bem mais amplas e com figuras menos complexas do que usamos na HQ. Na verdade, quando vi o filme pela primeira vez, eu disse ao Andy Wachowski que achava o filme semelhante a um cartum político colocado na telona. E isso faz do filme algo ainda mais forte.
WS: No que diz respeito ao design de personagem, V funciona como um jogo visual: amigo e inimigo, masculino e feminino, satírico e letal, histórico e moderno. Como você chegou a esse conceito visual, a esse enigma que sempre traz a questão: quem é V?
DL: Um acidente. Uma boa dose de sorte. A idéia de o personagem adotar a vestimenta e persona de Guy Fawkes deu-nos aquela ambiguidade por pura sorte. Muitas coisas ótimas no processo de criação surgem de acidentes, e não de planejamento: é o inesperado que dá aquela fagulha extra de vida a algo que, de outra maneira, seria relativamente comum. O ponto básico do personagem é que ele seria um revolucionário e um anarquista - e então um outro ponto era que ele teria algo de flamboyant ou teatral. Guy Fawkes foi um famoso anarquista na história [envolvido numa malsucedida tentativa de explodir o Prédio do Parlamento, no dia 5 de novembro de 1605], alguém com quem todos na Inglaterra estavam familiarizados. Pareceu-nos uma ótima idéia se um novo criador do caos ressuscitasse o espírito de Fawkes, bem como suas intenções! E foi assim que aconteceu.
WS: V de Vingança é sem dúvida um trabalho revolucionário. O tema do anarquismo versus fascismo e a narrativa envolvente eram então muito novos nos quadrinhos de aventura. Além disso, os desenhos mostram um senso de profundidade e textura ausentes na maioria dos quadrinhos das grandes editoras. Contudo, V quase ficou incompleto!
Wellington Srbek: É 1981 e o editor Dez Skinn está montando uma nova revista chamada Warrior. Você já tinha trabalhado para ele antes, e ele pede a você para criar uma nova série de aventura, similar a Night Raven. Então Alan Moore se junta ao projeto. Foi assim que V de Vingança nasceu, certo?
David Lloyd: Basicamente, sim. Dez inicialmente sugeriu que eu escrevesse e desenhasse a série - mas eu já tinha trabalhado com Alan em HQs do Doctor Who, gostei de trabalhar com ele e instintivamente sabia que podíamos criar algo muito bom se trabalhássemos em parceria. Alan já estava a bordo da Warrior com seu projeto de estimação de atualizar o Marvelman. V acabou se tornando uma combinação de dois conceitos que tínhamos bolado independentemente, mas que não tínhamos utilizado - um sobre uma guerrilha urbana feminina numa futura Inglaterra fascista, e outro sobre um assassino em série estranhamente vestido. O resultado final veio depois de muito brainstorm.
WS: A Inglaterra tem uma longa tradição em artes gráficas associadas à crítica política, desde um mestre como William Hogarth e um gênio como James Gillray a publicações como The Punch. Você vê V de Vingança como parte dessa tradição?
DL: Sim, certamente. Embora eu ache que a sutileza de V a tire da área da caricatura na qual a maioria da sátira política opera. Eu acho que o filme se aproxima mais daquele estilo de coisa, porque ele conta sua história em pinceladas bem mais amplas e com figuras menos complexas do que usamos na HQ. Na verdade, quando vi o filme pela primeira vez, eu disse ao Andy Wachowski que achava o filme semelhante a um cartum político colocado na telona. E isso faz do filme algo ainda mais forte.
WS: No que diz respeito ao design de personagem, V funciona como um jogo visual: amigo e inimigo, masculino e feminino, satírico e letal, histórico e moderno. Como você chegou a esse conceito visual, a esse enigma que sempre traz a questão: quem é V?
DL: Um acidente. Uma boa dose de sorte. A idéia de o personagem adotar a vestimenta e persona de Guy Fawkes deu-nos aquela ambiguidade por pura sorte. Muitas coisas ótimas no processo de criação surgem de acidentes, e não de planejamento: é o inesperado que dá aquela fagulha extra de vida a algo que, de outra maneira, seria relativamente comum. O ponto básico do personagem é que ele seria um revolucionário e um anarquista - e então um outro ponto era que ele teria algo de flamboyant ou teatral. Guy Fawkes foi um famoso anarquista na história [envolvido numa malsucedida tentativa de explodir o Prédio do Parlamento, no dia 5 de novembro de 1605], alguém com quem todos na Inglaterra estavam familiarizados. Pareceu-nos uma ótima idéia se um novo criador do caos ressuscitasse o espírito de Fawkes, bem como suas intenções! E foi assim que aconteceu.
WS: V de Vingança é sem dúvida um trabalho revolucionário. O tema do anarquismo versus fascismo e a narrativa envolvente eram então muito novos nos quadrinhos de aventura. Além disso, os desenhos mostram um senso de profundidade e textura ausentes na maioria dos quadrinhos das grandes editoras. Contudo, V quase ficou incompleto!
DL: Não estou muito certo de qual é a pergunta, mas sim, a HQ ficou no limbo por um tempo quando a Warrior fechou. Você está certo em dizer que ela era bastante não-convencional para a época, mas V tinha criado uma reputação para si mesma nos anos que foi publicada, assim ela teria encontrado um novo editor se tivemos nos esforçado bastante para achar um. Acho que a necessidade de seguir em frente fazendo algum dinheiro e construindo nossas carreiras impediu-nos de buscar isso. Mas então, quando Alan alcançou seu grande sucesso na DC Comics, eles estavam bem felizes em continuar qualquer coisa em que ele estivesse envolvido, e eles sabiam sobre V, assim ficaram felizes em pegá-la e continuá-la.
WS: Comercialmente, o uso das cores e do formato comic book são as escolhas certas para o mercado norte-americano. Mas tenho que confessar que prefiro V de Vingança em P&B e no formato magazine da Warrior. A luz é muito bonita e os detalhes do desenho mais fortes. Você não sente que algo se perdeu?
DL: P&B é puro e simples - logo ele é universal em seu apelo. Por outro lado, as cores podem ser atrativas ou não atrativas, pois pessoas têm cores favoritas. Alguns preferem azul. Outros odeiam verde. Há até mesmo superstições sobre cores! Assim, em termos estéticos, as cores vão ser sempre mais problemáticas que o P&B. Para mim, o único problema com as cores em V é que desde o início na DC nós não conseguimos os melhores resultados de impressão, e eu fui ingênuo em esperar mais do que conseguimos. Apenas nas edições mais recentes em capa-dura, nos Estados Unidos, Escandinávia e Alemanha, isso foi remediado, porque tive a oportunidade de alterar as cores para os valores tonais e consistência que elas deveriam ter. Assim, essas são as edições definitivas. Acredite, tudo teria sido diferente se tivéssemos na época o que temos agora - colorização por computador, uma tecnologia muito melhor e uma postura em relação aos quadrinhos bem mais esclarecida por parte dos impressores. Mas o que quer que se pense sobre isso, no entanto, as cores conquistaram para V um público bem mais amplo do que ela teria - e sem uma grande perda para seu valor artístico. Eu acho que isso justifica seu uso.
WS: E quanto à produção de Hollywood? Ela faz jus a seu trabalho e ao de Alan Moore?
DL: É uma boa versão da história original. Não é perfeita, mas não tenho nada a fazer senão felicitar os Wachowskis, James McTeigue, Joe Silver e todos os demais envolvidos com a produção. Eles fizeram um ótimo trabalho ali - e assim espalharam a mensagem essencial contida no original. Mas o quadrinho, é claro, é melhor.
A seguir: David Lloyd fala de sua nova graphic novel, que será lançada no Brasil em 2008.
WS: Comercialmente, o uso das cores e do formato comic book são as escolhas certas para o mercado norte-americano. Mas tenho que confessar que prefiro V de Vingança em P&B e no formato magazine da Warrior. A luz é muito bonita e os detalhes do desenho mais fortes. Você não sente que algo se perdeu?
DL: P&B é puro e simples - logo ele é universal em seu apelo. Por outro lado, as cores podem ser atrativas ou não atrativas, pois pessoas têm cores favoritas. Alguns preferem azul. Outros odeiam verde. Há até mesmo superstições sobre cores! Assim, em termos estéticos, as cores vão ser sempre mais problemáticas que o P&B. Para mim, o único problema com as cores em V é que desde o início na DC nós não conseguimos os melhores resultados de impressão, e eu fui ingênuo em esperar mais do que conseguimos. Apenas nas edições mais recentes em capa-dura, nos Estados Unidos, Escandinávia e Alemanha, isso foi remediado, porque tive a oportunidade de alterar as cores para os valores tonais e consistência que elas deveriam ter. Assim, essas são as edições definitivas. Acredite, tudo teria sido diferente se tivéssemos na época o que temos agora - colorização por computador, uma tecnologia muito melhor e uma postura em relação aos quadrinhos bem mais esclarecida por parte dos impressores. Mas o que quer que se pense sobre isso, no entanto, as cores conquistaram para V um público bem mais amplo do que ela teria - e sem uma grande perda para seu valor artístico. Eu acho que isso justifica seu uso.
WS: E quanto à produção de Hollywood? Ela faz jus a seu trabalho e ao de Alan Moore?
DL: É uma boa versão da história original. Não é perfeita, mas não tenho nada a fazer senão felicitar os Wachowskis, James McTeigue, Joe Silver e todos os demais envolvidos com a produção. Eles fizeram um ótimo trabalho ali - e assim espalharam a mensagem essencial contida no original. Mas o quadrinho, é claro, é melhor.
A seguir: David Lloyd fala de sua nova graphic novel, que será lançada no Brasil em 2008.
2 comentários:
Grande entrevista, Wellington! E ainda tem mais?!?
Bacana a versão original. E ficou muito boa a tradução!
Abraço!
Valeu, Anderson! Aqui na empresa fazemos sempre o máximo pela satisfação dos clientes...
Sobre a tradução, foi uma pena a Pixel não ter prestado atenção na tradução de Promethea #1 que enviei para eles como teste no início do ano passado, pois ela ficou melhor do que a que eles publicaram, além de manter as rimas do texto original de Alan Moore.
No mais, a parte final da entrevista estará no ar, neste mesmo bat-canal, em breve.
Abraço!
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