17/11/2007

Warrior: 25 anos de uma revista definitiva.


Em março de 1982, era lançada na Grã-Bretanha a Warrior. Talvez você nunca tenha ouvido falar dessa revista, mas o fato é que com ela teve início uma revolução qualitativa que influenciaria os rumos dos quadrinhos ocidentais nas últimas décadas. Para ilustrar esta afirmação, basta dizer que foram nas páginas da Warrior que estrearam as séries Marvelman (Miracleman) e V for Vendetta (V de Vingança), duas das mais importantes e inovadoras criações de Alan Moore.

A Warrior foi uma cria do editor inglês Dez Skinn, que fizera carreira editando revistas para a sucursal britânica da Marvel, como a Doctor Who Weekly que trazia HQs, bastidores e curiosidades sobre uma popular série da tevê britânica (cuja versão mais recente vem sendo exibida no Brasil desde 2006 pelo canal a cabo People & Arts). Seguindo o padrão britânico, sua nova revista de antologia era publicada em preto & branco, formato magazine (21cm x 30cm), e trazia séries divididas em capítulos de cinco a oito páginas. Na introdução para o número de estréia, o editor propunha: “Se a Warrior representa um progresso na evolução das revistas em quadrinhos britânicas, apenas você [leitor] pode decidir, mas nós definitivamente sentimos que é nosso primeiro passo na estrada da liberdade”.

A liberdade criativa a que se referia Skinn tinha como correlato a manutenção pelos autores de boa parte dos direitos autorais sobre personagens e histórias. Com isso, roteiristas e desenhistas sentiam-se motivados a produzir seus melhores trabalhos, pois estes continuariam a lhes pertencer parcialmente (diferente do que acontecia, por exemplo, com as HQs publicadas na popular e bem-sucedida 2000 AD). Após dez meses de preparativos e ensaios, a Warrior chegou aos pontos de venda com uma incomum mistura de terror, aventura, suspense, ficção científica e super-heróis. E Skinn parecia até antever o efeito que sua publicação teria: “Enquanto as grandes editoras de quadrinhos parecem estar num período de regressão criativa [algo não muito diferente de hoje], nós esperamos que nossa tentativa, nossa pequena revista num mar de outras, acenda bastante interesse para fazer as coisas caminharem de novo”.

Os destaques da primeira edição? Uma bem-bolada HQ de duas páginas criada por Dave Gibbons, uma história medieval desenhada por John Bolton, um anúncio publicitário ilustrado por Brian Bolland e, é claro, as estréias de V for Vendetta com desenhos de David Lloyd e de Marvelman com desenhos de Garry Leach (esta última acompanhada de um texto sobre a trajetória editorial deste que foi o primeiro super-herói britânico). Embora Skinn afirme que o objetivo era “acertar logo de primeira”, a Warrior foi mesmo tomando forma definitiva nas edições seguintes, com o surgimento de novos personagens e substituições de artistas (em especial a entrada de Alan Davis como desenhista de Marvelman, no lugar de Garry Leach que iria desenhar a HQ “Warpsmith: cold war, cold warrior”, capa do número 10).

O auge da Warrior veio com o número 11, que trazia os capítulos finais do "Volume I" de V for Vendetta e do "Livro Um" de Marvelman. Na edição seguinte, a capa marca a estréia de uma nova série escrita por Alan Moore: The Bojeffries Saga (uma versão bastante cáustica de A Família Addams) com desenhos de Steve Parkhouse. Esse número 12 trouxe ainda a HQ "Young Marvelman: 1957", um roteiro de Moore desenhado por John Ridgway, e o capítulo “This Vicious Cabaret” em que o enigmático V canta e toca piano. Já na Warrior n°16 uma atração especial para o Natal de 1983: a HQ “Christmas on Depravity", desenhada por Curt Vile (pseudônimo de Alan Moore) e escrita por Pedro Henry (pseudônimo de seu amigo Steve Moore). Mas, naquele mesmo ano em que a revista firmava sua proposta e começava a conquistar prêmios, seus maiores problemas começaram.

Com o sucesso da versão criada por Alan Moore, Dez Skinn decidiu lançar Marvelman Special n°1, que trazia basicamente reimpressões de HQs dos anos 50, produzidas pela equipe do criador do personagem, Mike Anglo. Contudo, a Marvel Comics (que se considera a dona da palavra “marvel” no ramo dos quadrinhos) interferiu judicialmente, dificultando a continuação da série na Warrior e causando desavenças entre Skinn e Moore (o que levou ao aborto do projeto Nightjar, que teve o primeiro capítulo desenhado por Bryan Talbot e antecipava elementos que Moore utilizaria mais tarde no personagem John Constantine). Como resultado das disputas jurídicas e brigas pessoais, Marvelman foi suspensa no número 21 da Warrior. Sem sua série mais popular e não tendo alcançado um sucesso de vendas avassalador, a publicação chegou ao fim no número 26, em janeiro de 1985. De qualquer forma, sua contribuição para a história dos quadrinhos ocidentais já estava assegurada.

No formato magazine da Warrior, as páginas de V for Vendetta desdobravam-se no contraste em preto & branco dos desenhos de Lloyd (algo que se perde na edição em cores e formato reduzido da DC Comics). Além disso, o texto rebuscado e a trama política compostos por Moore eram então algo muito incomum para quadrinhos de aventura e mistério. Quanto a Marvelman (publicado no Brasil, via edição norte-americana, com o título Miracleman), a série de Moore, Leach e Davis teve um enorme impacto, sendo a primeira recriação racionalista de um super-herói clássico, nos anos 80. Estes dois trabalhos ficariam incompletos até 1989, quando Moore escreveu seus capítulos finais para as editoras DC Comics e Eclipse respectivamente. De qualquer forma, foi após despontar no mercado britânico, com HQs para a Warrior e também a 2000 AD, que Alan Moore acabou contratado pelo editor Lein Wein para assumir os roteiros da revista Swamp Thing (Monstro do Pântano). E aí, como se diz, “o resto é história”!

Para os interessados, todos os números da Warrior ainda podem ser encontrados à venda em lojas virtuais
britânicas e norte-americanas.

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