27/05/2009

Sete perguntas para o desenhista Rubens Lima.


Conheci Rubens Lima no início de 2008, quando eu procurava um desenhista para a reformulação de meu herói Solar. Rubens havia lido a versão original do personagem e se interessou em trabalhar comigo no novo projeto. Acertamos valores, prazos e iniciamos o trabalho. Em abril passado, lançamos Solar: Renascimento que foi a estréia de Rubens como desenhista de quadrinhos. Em breve lançaremos a revista Solar: Solo Sagrado, na qual seu trabalho deu um incrível salto qualitativo. Na pequena entrevista a seguir, vocês poderão saber um pouco mais sobre este promissor artista brasileiro.

Para começar, Rubens, algumas informações biográficas para os leitores do blog saberem um pouco mais a seu respeito: quando e onde você nasceu? É casado? Tem filhos? Gosta de futebol?

Vamos começar como uma declaração. Sou Brasileiro, casado, pai de dois filhos, tenho 29 anos, nascido em 23 de fevereiro, num dia de jogo do GALO [Clube Atlético Mineiro] contra o Palmeiras, pelo campeonato brasileiro do ano anterior.

Como e quando os quadrinhos passaram a fazer parte de sua vida?

Através do meu avó e do meu tio. Meu avó foi o primeiro a me proporcionar contato com uma revista em quadrinhos, a comics mesmo, uma Batman: Digital Justice. E o meu tio (na época residente de Medicina) me incentivou a leitura antes mesmo desta Batman, que eram os quadrinhos Disney, do Tio Patinhas, Pato Donald, que me cativaram de uma forma que acho que hoje só incentivaria uma criança se fosse um jogo de uma plataforma como PS3 ou coisa similar, tamanho meu deslumbramento naquele dia (detalhe que no mesmo dia fui também apresentado ao A Nightmare on Elm Street [A Hora do Pesadelo] e The Friday 13th [Sexta-Feira 13], marcante não?!).

Antes de Solar seus principais trabalhos foram ilustrações para livros de RPG e literatura de fantasia, certo? Você tem uma predileção pelo gênero da fantasia medieval ou isso foi uma circunstância de trabalho?

Tenho certeza que os dois, então diria que tive uma sorte tremenda, pelo casamento das oportunidades, mas Solar me acendeu de novo aquela chama do cotidiano, de que aquilo que faz parte do nosso dia-a-dia é muito mais interessante do que as comics se prestam tratando só do fim do universo, de um conquistador voraz ameaçando um planeta indefeso ou se esses ícones vão ao banheiro! Sabem, tem uma vida, dureza!

Em termos técnicos e de estilo, como foi fazer a transição da ilustração para os quadrinhos e da fantasia medieval para algo mais urbano e cotidiano?

Foi duro na época. Os 3 primeiros capítulos eu posso dizer muito claramente que são muito focados no direcionamento editorial do que um trabalho de entendimento profundo da minha parte sobre o que se tratava a história pra dispor das coisas certas no traço, mas a partir da transição do capítulo 4 para o capítulo 5, acredito que encontrei o ponto que você, Wellington, entendia como a transposição mais próxima da sua nova concepção do Solar.

Quando iniciamos nossa colaboração na reformulação do Solar, você me disse que um dos motivos para se interessar pelo trabalho era o fato de o Solar original ter tido um significado para você quando o leu nos anos 90. Queria que falasse um pouco sobre isso.

Acredito que tenha a ver com um fechamento de um ciclo semi-profissional pra algo maior, sabe! Uma transição da adolescência pra fase adulta, em que pra mim era necessário participar de algo que eu vi quando garoto e ter a certeza de que podia fazer melhor do que foi feito à época (na concepção do traço).

Agora que você está desenhando as últimas páginas de nossa colaboração na série Solar, qual seu balanço pessoal deste trabalho? Para mim, há uma incrível evolução do capítulo 1 ao capítulo 7.

A evolução é notável, foi enriquecedor de todas as formas, profissionalmente cresci, aprendi muito, me tornei um profissional melhor, além de tudo isto, ganhei um amigo, uma pessoa sincera acima de tudo. No final, entre mortos e feridos salvaram-se todos.

Para encerrar, como você vê o mercado de ilustração e quadrinhos no Brasil hoje? Quais são suas perspectivas para o segundo semestre e os próximos anos?

Até tivemos uma discussão sobre este assunto, e tenho perspectivas diferentes em relação ao mercado de quadrinhos. Enquanto não houver uma política para auxiliar as publicações nacionais, como diminuição dos impostos, e não o apoio a um só projeto específico que não contribui para um crescimento geral, mas sim para um ganho exclusivo, não vejo crescimento uniforme do mercado, continuando as publicações a serem tratadas como projetos, e não como um produto a ocupar um espaço no cotidiano e nas prateleiras do Brasil. No caso das ilustrações, o espaço é muito maior e tem editoras que pagam quantias até decentes, apesar de serem trabalhos esparsos, que já conta com gente boa atuando, ou seja, tem que ralar pra ficar bom, pra entrar.

24/05/2009

Estudos para um jurupari (3).


Nos quadrinhos, o trabalho de definição do visual de um personagem tem como fim sua inserção nas páginas de uma HQ. E é isto o que vemos na imagem acima, que mostra o Solar às voltas com o surgimento de um monstruoso jurupari. Esta foi uma primeira versão da página, num desenho impressionante de Rubens Lima, que aparecerá na revista Solar: Solo Sagrado com um enquadramento um pouco modificado. Aguardem, pois a revista está ficando muito bacana!

23/05/2009

Estudos para um jurupari (2).


Após seus primeiros estudos para o jurupari, fiz algumas sugestões ao desenhista Rubens Lima, para termos uma figura mais monstruosa e menos humana. Com uma estrutura corporal modificada, chegamos na imagem acima a um visual bem bacana para o monstro mitológico que aparecerá na revista Solar: Solo Sagrado.

22/05/2009

Estudos para um jurupari (1).


O “jurupari” é uma figura da cultura indígena e do folclore brasileiro, ligada à imposição de uma lei e à organização do mundo. Numa das versões (a qual utilizei no álbum Muiraquitã) o Jurupari foi enviado à Terra pelo deus dos homens para pôr fim ao reino do matriarcado. Segundo outras fontes, os juruparis seriam um povo-peixe inventado pelo deus criador para manter a ordem no mundo recém-criado. É esta versão que utilizo na série Solar, e é por este motivo que temos aqui os primeiros estudos para um jurupari feitos pelo desenhista Rubens Lima.

21/05/2009

Solar, num superdesenho do Will!


Conheci o trabalho do desenhista Will em 2007, através de sua revista Sideralman. Foi “amor à primeira vista”! Naquelas páginas em P&B, o traço conciso em estilo cartunizado casava perfeitamente com o clima retrô-pop das HQs do desmemoriado super-herói de Nova Luz. A revista do Sideralman (ainda disponível para venda) era de longe a publicação mais madura e bem-acabada de toda a leva de novos quadrinhos independentes da época.

Mais legal ainda foi quando pude conhecer o autor pessoalmente, durante o FIQ 2007. Um cara superlegal, Will é sempre um ótimo papo. Tornei-me um fã de seu traço e ficou já ali a promessa de uma colaboração que, espero, ainda realizaremos...
Por enquanto, vai aqui a versão superbacana que ele fez para o Solar (para ver o desenho ampliado, basta clicar na imagem). Se algum dia houver um “Solar – O Desenho da TV”, o estilo bem que poderia ser tão legal quanto este superdesenho. Aproveitem! E valeu demais, Will!

18/05/2009

Super-heróis adolescentes: dos Novos Titãs aos Novos Mutantes.


As primeiras aventuras do Robin em 1940 e do Kid Flash no fim dos anos 50 foram uma estratégia editorial para criar uma identificação ainda maior entre personagens e público. Avançando nessa linha, em meados dos anos 60, a DC Comics lançou os Jovens Titãs, grupo que era uma espécie de versão infanto-juvenil da Liga da Justiça. Mas o verdadeiro sucesso só viria em 1980, com o lançamento da revista The New Teen Titans, produzida por Marv Wolfman e George Pérez. Trazendo heróis já conhecidos, como Robin, Kid Flash e Moça-Maravilha, a nova série também apresentava novas criações, como a feiticeira Ravena, a alienígena Estelar e o ciborgue Ciborgue. Completando o time, havia o engraçado transmorfo Mutano, um ex-membro da Patrulha do Destino.

Com histórias e desenhos elaborados, The New Teen Titans trazia aventura e superpoderes, mas também drama e romance. Representando um salto de maturidade no “Universo DC”, as tramas complexas e os questionamentos pessoais pelos quais os Novos Titãs passavam cativaram os leitores da época. Havia o relacionamento amoroso entre Robin e Estelar, os problemas de aceitação enfrentados por Ciborgue e os conflitos existências de Ravena (cujo pai era um demônio de outra dimensão). Era evidente, no entanto, que as situações dramáticas e a exploração psicológica dos Novos Titãs eram a resposta da DC ao crescente sucesso de um outro grupo de super-heróis, os X-Men da Marvel (os dois grupos chegaram até a se encontrar numa edição especial).

No final dos anos 70, quem começava a dar as cartas no mercado norte-americano era mesmo a Marvel, cujos heróis menos unidimensionais agradavam em cheio ao público. De fato, qualquer leitor adolescente iria se identificar mais facilmente com os dilemas do jovem Peter Parker / Homem-Aranha, do que com a infalibilidade do impoluto Clark Kent / Super-Homem. E com a chegada dos anos 80, personagens mais complexos e menos certinhos, como Noturno e Wolverine, ganharam um maior destaque. A resposta do público às HQs produzidas por Chris Claremont e John Byrne foi tão positiva que logo a revista The Uncanny X-Men se tornou uma das campeãs de vendas do mercado, dando origem a toda uma linha de revistas com heróis mutantes.

Assim, em 1982, a Marvel lançou os Novos Mutantes, um grupo de super-heróis adolescentes inéditos, criados por Chris Claremont e Bob McLeod, que no ano seguinte ganharam uma série regular. Em alguns sentidos, The New Mutants era uma volta às origens dos X-Men, uma vez que os novos alunos selecionados pelo Professor X usavam uniformes semelhantes aos dos primeiros heróis mutantes. Multiétnica, a formação inicial dos Novos Mutantes contava com a índia Miragem, o caipira ianque Míssil, a escocesa Lupina, a vietnamita Karma e o “brasileiro” Mancha Solar (que se chamava Roberto da Costa, mas costumava soltar expressões em espanhol, como “Madre de Dios!”). Outros personagens logo entraram em cena, como Magma, Mágica, Warlock e Cifra.

Apesar de enfrentarem desafios e ameaças semelhantes aos dos X-Men, os Novos Mutantes muitas vezes se viam às voltas com problemas e interesses próprios à sua faixa etária. O resultado foi um razoável sucesso, uma vez que os leitores da revista eram em sua maioria adolescentes que partilhavam da mesma cultura e dos mesmos questionamentos daqueles heróis. Lembro-me que havia realmente um apelo diferenciado naqueles personagens que enfrentavam super-vilões ao mesmo tempo em que lidavam com incertezas da adolescência. Além disso, a série tinha bons roteiros e pôde contar com excelentes desenhos nas catorze edições desenhadas por Bill Sienkiewicz, bem como nas duas HQs especiais ilustradas por Arthur Adams.

A revista Teen Titans continua sendo publicada pela DC Comics com uma nova formação de heróis. Já a New Mutants acaba de ser relançada pela Marvel com alguns dos principais heróis da formação original. Mas, nestes casos, o melhor mesmo é optar pela qualidade das HQs originais. A DC já relançou várias coletâneas de The New Teen Titans e a Marvel tem lançado finalmente reedições de The New Mutants. No Brasil, apenas algumas histórias dos Novos Titãs criadas por Marv Wolfman e George Pérez estão disponíveis no momento. Até onde sei, a Panini não anunciou planos de relançar as aventuras dos Novos Mutantes. O certo é que os heróis adolescentes da DC e Marvel têm um lugar especial na memória de quem leu suas HQs naqueles anos 80.

10/05/2009

Os X-Men de Warren Ellis e Simone Bianchi.


Devido ao sucesso dos filmes e a algumas boas HQs produzidas por autores como os escoceses Grant Morrison e Frank Quitely, na última década os X-Men voltaram ao primeiro plano dos quadrinhos. Com o lançamento em 2004 da série Astonishing X-Men, criada pelos norte-americanos Joss Whedon e John Cassaday, a Marvel consolidou um modelo editorial que soma qualidade autoral e bons resultados comerciais. Como estava pré-determinado, após vinte e quatro edições e um especial elogiados pelo público e pela crítica, os autores deixaram a revista em 2008, abrindo caminho para o inglês Warren Ellis e o italiano Simone Bianchi. Contudo, famosos por trabalhos bastante peculiares, os novos responsáveis pela Astonishing X-Men talvez não consigam agradar tão unanimemente quanto seus antecessores.

Estreando na Astonishing X-Men n°25, Ellis e Bianchi deverão trabalhar no mesmo modelo editorial que a Marvel adotou para a primeira fase da revista. A fórmula é contratar autores renomados para produzirem uma série limitada que dará origem a coletâneas em capa cartonada com seis capítulos cada, que depois ganharão reedições em capa-dura com doze capítulos, sendo que mais tarde tudo será reunido num único calhamaço com centenas de páginas (a omnibus edition). Mas, desta vez, a fórmula pode não funcionar tão bem, já que a Marvel reuniu numa mesma série comercial dois autores com trabalhos marcantemente pessoais. Isso é o que vemos nas primeiras páginas produzidas pela dupla, que não repetem o caráter mais clássico da fase anterior, baseando-se em temas recorrentes e num estilo pessoal inconfundível.

Na primeira página de Astonishing X-Men n°25, uma nota editorial anuncia: “Uma nova era na história mutante começou. Com sua antiga base destruída, os X-Men transferiram-se para São Francisco na esperança de estabelecer um novo refúgio para sua raça. Com os mutantes agora reduzidos a poucas centenas, o líder dos X-Men, Ciclope, está determinado a proteger essa frágil comunidade por quaisquer meios necessários”. O que vemos a seguir, no entanto, não é nada tão dramático: Wolverine dormindo numa árvore, Fera cantarolando, a nova x-man Armadura reclamando de seu codinome, Ciclope e Emma Frost acordando juntos, a chegada de Tempestade... Sucedem-se então questões acerca da qualidade do café, diálogos cheios de implicâncias e cinismo, explicações sobre a nova estratégia de atuação do grupo...

Quando a revista está caminhando para o fim, finalmente os X-Men entram (quase) em ação, ao serem chamados pela polícia local para auxiliar na investigação de um assassinato envolvendo mutantes. Ellis ainda tem espaço para uma de suas explicações para-científicas, antes de encerrar seu primeiro roteiro para a série anunciando uma trama envolvendo (de novo) naves e tecnologia alienígenas. E é exatamente isso (e um pouco mais de ação) o que vemos em Astonishing X-Men n°26, quando acompanhamos os X-Men numa viagem a um “cemitério de espaçonaves”, onde o mutante assassino se encontra. É introduzido aí o elemento que dá título a esses capítulos: “Ghost Box”, um poderoso aparato de origem extradimensional (sim, novamente Ellis apresentará uma trama envolvendo viagens e conflitos no “multiverso”).

Em Astonishing X-Men n°27, os heróis mutantes estão de volta à base em São Francisco, onde temos mais diálogos ácidos e explicações para-científicas. Mas como os X-Men de Ellis não “esquentam cadeira”, logo partimos numa viagem até uma misteriosa região da China. Em Astonishing X-Men n°28, exploramos a cidade celestial dos mutantes chineses, onde são dadas algumas explicações sobre genética extradimensional. Para agradar aos leitores, o roteirista concede aos X-Men alguma ação contra mutantes locais, adicionando uma peça ao mistério: o nome de um ex-x-man que andava fora de circulação há algum tempo. Surpreendentemente, isso é quase tudo que vemos nos quatro capítulos iniciais de “Ghost Box”. Assim, no conjunto, as primeiras histórias de Ellis para os X-Men deixam a sensação de muita conversa para pouca história.

Se temáticas e idéias emprestadas de outros trabalhos dão base a “Ghost Box”, o elemento marcante das HQs são as páginas criadas pelo desenhista Simone Bianchi, em parceria com outros artistas italianos. No traço de Bianchi, todos os personagens ganharam novas feições e caracterizações incrivelmente detalhadas (embora nem sempre agradáveis). Refletindo-se nas composições de página e divisões de quadros, o visual privilegia sobreposições e diagonais, elementos decorativos e uma narrativa oblíqua. Áreas em branco e recortes, sombras em aguada e cores mais apagadas dão um tom frio às páginas, combinando com o tema da história. Com tudo isso, as imagens criadas por Bianchi & Cia. são visualmente impressionantes, mas um tanto estáticas, destoando do dinamismo que se espera de uma revista dos X-Men.

Com um estilo tão elaborado e trabalhoso, parece que Bianchi e seus colaboradores não conseguiram acompanhar a periodicidade mensal da série. Para compensar, a Marvel lançou a minissérie em duas edições Astonishing X-Men: Ghost Boxes, escrita por Ellis e ilustrada por diferentes desenhistas (trazendo apenas capas de Bianchi). Com duas histórias de oito páginas em cada edição, além dos roteiros originais e de reproduções das páginas a lápis, a minissérie mostra acontecimentos em quatro Terras diferentes. Na primeira história, vemos o trabalho dos veteranos Alan Davis e Mark Farmer, numa HQ centrada no mutante assassino que apareceu em Astonishing X-Men n°26. As três histórias seguintes têm artistas menos conhecidos e são narradas na perspectiva de três diferentes X-Men (Emma, Ciclope e Armadura).

A primeira história curta de Ghost Boxes, com sua temática dos universos paralelos, tem um gostinho da Captain Britain que Davis produziu para a Marvel nos anos 80. Já as HQs seguintes, ilustradas por Adi Granov, Clayton Crain e Kaare Andrews, têm um visual mais sombrio e um tom pós-apocalíptico. No geral, sem diálogos cínicos e tendo roteiros mais concisos, o trabalho de Ellis nas duas edições da minissérie é até mais interessante do que na série regular (mas vale, é claro, aguardar a conclusão de seu primeiro conjunto de seis histórias para chegarmos a um veredicto definitivo). O quinto capítulo de “Ghost Box” já foi lançado nos Estados Unidos em Astonishing X-Men n°29, estando o capítulo final programado para junho. Esta nova fase dos heróis mutantes deverá chegar ao Brasil em breve nas páginas de X-Men Extra da Panini.

08/05/2009

Os Novos X-Men de Grant Morrison em coletâneas da Panini.


Iniciada em meados de 2001, a fase de Grant Morrison à frente dos X-Men chegou trazendo mudanças, a começar pelo título da revista, que passou a se chamar New X-Men (ganhando um inteligente trabalho de formatação do logotipo). São evidentes algumas influências de X-Men – O Filme, como o destaque dado à função escola da Mansão X, e sobretudo o uniforme de couro preto adotado pelos heróis mutantes. Lançadas no Brasil em edições mensais da Panini, as histórias de Novos X-Men já ganharam por aqui duas coletâneas: E de Extinção e Imperial, que reúnem o primeiro ano de Morrison como roteirista dos heróis mutantes (embora tragam as mesmas edições, a organização das coleções da Panini diferem das da Marvel, que serviram de base para este texto).

Logo nas primeiras páginas, o roteirista escocês apresenta a temática central de seu primeiro ano à frente dos X-Men: uma possível extinção dos humanos causada pelos mutantes. Tudo é apresentado numa interessante correlação com a provável extinção do homem de neanderthal pelos homo sapiens. E isto ao mesmo tempo em que Morrison introduz uma nova vilã: Cassandra Nova, um ser poderoso cujo passado guarda uma intrigante ligação com o Professor X. Em seguida, temos alguns diálogos espirituosos entre os personagens principais, reflexões de Fera sobre sua nova forma física, referências a problemas conjugais entre Jean Grey e Ciclope, alguma ação contra robôs sentinelas e o genocídio de dezesseis milhões de mutantes.

As três primeiras HQs de Morrison com os X-Men terminam numa luta mortal, com a entrada de Emma Frost para o grupo de super-heróis e a promessa de uma nova era para o Professor X e seus pupilos. O capítulo seguinte (desenhado na horizontal e lançado originalmente em New X-Men Annual 2001) nos leva à China (país que parece ser uma fixação para os roteiristas britânicos), onde conhecemos o mutante Xorn, cujo cérebro é uma pequena estrela. Nas HQs que se seguem, conhecemos mais personagens coadjuvantes, como Barnell, Angel e John Sublime, numa história envolvendo experiências e contrabando de órgãos mutantes. O fato mais relevante, porém, é o ressurgimento de Cassandra Nova, através de uma possessão psíquica.

No restante do primeiro ano de Morrison com os X-Men, entra em cena o Império Shi’ar e Jean Grey assume aspectos da Fênix, enquanto somos levados em viagens espaciais e jornadas psíquicas. Mas, com sua abordagem cerebral e suas situações “realísticas”, não é de se espantar que a fase de Morrison não tenha agradado a muitos fãs. No conjunto, apesar de algumas idéias interessantes, E de Extinção e Imperial deixam a sensação de promessa não-cumprida. Emma Frost ganha um novo poder, Fera revela uma nova orientação sexual, temos um cérebro numa bolha de vidro e outras coisas que se espera de um roteiro de Morrison. Mas falta consistência nas histórias, faltam explicações para alguns acontecimentos e tudo se resolve fácil demais no fim.

Outro problema está no visual das HQs. Tudo começa muito bem com três edições desenhadas por Frank Quitely. Há uma história na horizontal desenhada Leinil Francis Yu, que até não é ruim. As coisas, no entanto, pioram muito depois, com desenhos de um Ethan Van Sciver ainda cru e edições ilustradas por um certo Igor Kordey que jamais deveria ter sido escalado para desenhar uma revista de super-heróis. O que salva é o retorno de Frank Quitely para mais três boas edições (incluindo a da viagem psíquica, claramente inspirada por artistas como Escher e Moebius). No geral, Novos X-Men merece uma lida (ou pelo menos seus três primeiros capítulos merecem). Mas é melhor não esperar o brilhantismo de outros trabalhos de Morrison, nem uma qualidade constante nos desenhos.

(As coletâneas E de Extinção e Imperial ainda estão disponíveis em lojas especializadas. E para quem quiser saber mais sobre os quadrinhos de Morrison ou dos X-Men, basta clicar nos nomes em destaque abaixo.)

06/05/2009

O pior dos X-Men e do Wolverine no cinema.


Aguardado com grande expectativa, X-Men – O Filme tornou-se um sucesso de bilheteria que deu origem à atual onda de produções hollywoodianas com personagens dos quadrinhos. Lançada três anos depois, a continuação X-Men 2 trouxe uma evolução do gênero, tornando-se provavelmente a melhor produção cinematográfica já feita com os heróis Marvel. Com sucesso de público e recursos milionários garantidos, a terceira parte da “trilogia” dos heróis mutantes tinha tudo para ser um fechamento com “chave de ouro”. Contudo, X-Men: O Confronto Final foi uma verdadeira decepção. E como Hollywood não “larga o osso” facilmente, chegou aos cinemas no último dia 30 de abril X-Men Origens: Wolverine, uma coisa tão ruinzinha que nem merece ser chamada de “filme”, mas sim de mero caça-níqueis hollywoodiano (e me fez até alterar novamente minha postagem com a lista das "Piores adaptações cinematográficas do século")!

Lançado em maio de 2006, X-Men: O Confronto Final, ou simplesmente X-Men 3, pôde contar com o mesmo elenco das produções anteriores, mas tinha um desfalque significativo. Não tendo chegado a um acordo com a 20th Century Fox, Bryan Singer assinou um contrato com a Warner Bros. para dirigir o que seria o fiasco chamado Superman Returns (mas essa é outra história...). O que importa é que, sem a mesma concepção e direção dos dois primeiros filmes, a terceira parte da trilogia seria de longe a pior. Há até uma boa sequência “exterminador do futuro” que se passa na Sala do Perigo e uma versão bacana do Fera e da Kitty Pryde, além de terem finalmente acertado no visual da Tempestade. Mas, em termos gerais, o que há de bom pára por aí. Dirigido por Brett Ratner, o longa traz uma história fraca e meio sentimentalóide, sem mostrar nada da elegância e originalidade dos dois primeiros filmes.

Em muitos sentidos, X-Men 3 é o inverso de X-Men – O Filme. Neste, há um fantasioso aparelho capaz de transformar humanos em mutantes; no outro, há uma fantasiosa droga capaz de transformar mutantes em humanos. Enquanto O Filme introduz personagens e cria laços pessoais, O Confronto Final atola em melodramas mutantes, lançando na tela hordas de figuras irrelevantes e estereotipadas. Professor-X e Magneto voltam a se confrontar na terceira parte da trilogia, mas não temos nada do equilíbrio e da força das atuações vistas na primeira parte (até o visual de Wolverine, perfeito no início da trilogia, eles conseguiram atrapalhar com uma perucona esquisita). Enfim, os recursos restritos e efeitos falhos da primeira parte não se repetem na terceira, que nem por isso consegue ser um filme melhor. X-Men 3, enfim, não passa de uma mistura fraquinha de ação, drama e efeitos visuais. Mas o pior ainda estava por vir!

Embora eu me considere uma pessoa até articulada, faltam-me palavras para descrever quão ruim é X-Men Origens: Wolverine. Enquanto roteirista, também fico abismado com o fato de alguém ter recebido muito dinheiro para escrever algo tão fraquinho e cheio de furos. Além disso, em suas quase duas horas, não há sequer um diálogo ou situação que não seja o mais completo lugar-comum (com direito a cenas tiradas de Akira, Superman – O Filme e até da abertura de Os Simpsons). A base para a história foi a dispensável minissérie Origem e o diretor (cujo nome nem perderei tempo procurando) parece só não ter assistido ou lido as coisas certas para fazer um bom filme sobre Wolverine (que seriam no caso X-Men 2 e a HQ Arma-X). Nesse filmeco de ação militarista e situações de mau-gosto, até os efeitos especiais são falhos (na sequência de luta final, Wolverine, Victor e Arma XI parecem bonequinhos de video game).

Em resumo, é lastimável o fato de Bryan Singer ter deixado incompleto seu trabalho na trilogia dos heróis mutantes (pois ele poderia ter avançado em relação ao que havia conseguido com X-Men 2, criando algo realmente memorável para os fãs de quadrinhos). Ainda assim, X-Men: O Confronto Final tem bons efeitos e é um filme assistível. Já X-Men Origens: Wolverine é um caso bem diferente, tratando-se de um lixo cinematográfico que não vale o trabalho de sair de casa e muito menos o preço do ingresso (ainda bem que, para escrever este texto, gastei apenas R$6,00, aproveitando a promoção de terça-feira!). Só resta torcer para que este tenha sido o último filme dos X-Men e do Wolverine, pelo menos pela próxima década (mesmo porque, apesar dos músculos que arrancam suspiros das mocinhas, Hugh Jackman está ficando meio velhinho para interpretar o Wolverine).

04/05/2009

O melhor dos X-Men no cinema.


Lançados em 1963 pela Marvel Comics, os X-Men tornariam-se nas décadas seguintes o grupo de super-heróis mais popular e rentável dos quadrinhos. Tanto que, além de dar origem a toda uma linha de revistas de heróis mutantes nos anos 80, os X-Men ganharam uma série de animação nos anos 90 (cujas principais consequências foram tornar Wolverine um personagem amplamente conhecido e ensinar aos leitores brasileiros a correta pronúncia do nome do grupo, uma vez que até então nós falávamos “xis-mem”). Com a crescente popularidade entre os leitores de quadrinhos e o público da série de animação, a idéia de um filme para o cinema seria algo quase natural. Assim, após alguns anos de produção e meses de muita expectativa por parte dos fãs, em julho de 2000 estreou X-Men – O Filme, sucesso de bilheteria que inaugurou a atual onda de adaptações de HQs para o cinema.

Dirigido por Bryan Singer, X-Men – O Filme seguiu alguns dos elementos de Superman – O Filme, a melhor adaptação cinematográfica de super-heróis já feita (não é mera coincidência que o diretor do longa de 1978, Richard Donner, seja um dos produtores executivos da produção de 2000). Como o filme que lhe serviu de exemplo, o longa dos X-Men pôde contar com um diretor que entendia o projeto, atores consagrados que lhe davam lastro e protagonistas relativamente desconhecidos que se adequavam bem a seus papéis. Embora Tempestade e Ciclope pareçam meros elementos decorativos, por sua vez Professor Xavier (Patrick Stewart), Magneto (Sir Ian McKellen), Wolverine (Hugh Jackman) e Vampira (Anna Paquin) não deixam a desejar. E se Jean Grey e Homem-de-Gelo parecem deslocados, Mística e Dente-de-Sabre são ótimas surpresas, superando em muito suas versões quadrinísticas.

Ao lado de boas atuações e caracterizações, a maior qualidade de X-Men – O Filme é o respeito pelos quadrinhos, em sua tentativa de uma abordagem realista do tema (tratado na verdade como uma história de ficção científica). Há é claro algumas alterações (como as roupas de couro preto que causaram controvérsia entre os fãs), algumas liberdades (como a relação afetiva entre Wolverine e Vampira, que nas HQs acontecia entre Logan e Kitty Pryde) e alguns excessos (como o aparelho que funciona à base de eletromagnetismo, emitindo uma radiação que origina poderes mutantes). Além disso, os mesmos efeitos visuais de ponta que permitiram a existência de um filme com muitos vôos, rajadas óticas e garras retráteis, mostram suas limitações em vários momentos, comprometendo a verossimilhança das cenas. Há também problemas com as sequências de luta demasiadamente coreográficas.

Contando com a consultoria de Stan Lee, o roteiro de X-Men – O Filme tem falhas, mas é eficiente em apresentar a temática da perseguição e do preconceito sofridos pelos mutantes. E se nos quadrinhos a identificação dos mutantes com minorias raciais, sexuais ou religiosas é um traço importante, num filme voltado a um público mais amplo esse fato é ressaltado. Logo, não é por menos que a primeira cena se passa num campo de extermínio nazista, ou que o ator Ian McKellen tenha sido convencido por Bryan Singer de que uma história com super-heróis podia servir de metáfora para o preconceito contra os homossexuais. Mensagens à parte, o filme tem alguns ótimos momentos, como as três cenas em que Professor Xavier e Magneto se contrapõem (no senado, em frente à estação de trem e na cela de plástico) ou as três sequências principais com Wolverine e Vampira (na estrada, na Mansão-X e no vagão de trem).

Disponíveis na versão para DVD X-Men 1.5, as cenas cortadas mostram que a história era ainda mais centrada em Vampira. Contudo, na versão para os cinemas, parece ter se buscado um equilíbrio entre os personagens (que acabou não sendo alcançado). A Tempestade Halle Berry, por exemplo, não tinha muito o que fazer com poucas cenas relevantes e uma ridícula peruca branca. Por sua vez, os intérpretes de Ciclope (James Marsden) e Jean Grey (Famke Hanssen) deixam claro, nos extras do DVD, que não tinham conhecimento ou muito respeito pelos quadrinhos que inspiraram seu trabalho. Já o Wolverine Hugh Jackman é um caso completamente diferente, pois (embora não conhecesse de antemão seu personagem) o ator mostrou empolgação desde o início, sendo perfeito no papel que mudaria sua carreira. Para completar, há o duelo entre Patrick Stewart e Ian McKellen, que acrescenta qualidade ao filme.

Ao ser exibido em 2000, X-Men – O Filme deixou uma sensação de algo que ficou pela metade, de uma adaptação que não é ruim, mas que poderia ter sido muito melhor. Felizmente, o sucesso de bilheteria garantiu uma continuação, que se tornaria a melhor versão dos heróis da Marvel já feita para o cinema. Lançado em maio de 2003, também dirigido por Bryan Singer e contando com o mesmo elenco de base, X-Men 2 tem todas as virtudes do primeiro filme, corrigindo seus principais erros. Uma produção bem mais madura, essa continuação traz um roteiro muito melhor, efeitos especiais e visuais impecáveis, cenários e figurinos ainda mais convincentes e até mesmo uma música-tema mais empolgante. Começando por sua primeira cena, o filme provou que tinha vindo para agradar: numa sequência fantástica, Noturno invade a Casa Branca, dá uma surra nos seguranças e quase mata o presidente.

A seguir, novos vilões são introduzidos e temos um ataque à Mansão-X, com direito a garras retalhadoras e novos poderes mutantes. O público também descobre um pouco mais sobre o nebuloso passado de Wolverine (nos moldes da HQ Arma-X de Barry Windsor-Smith). Halle Berry (depois de um Globo de Ouro e um Oscar) ganhou mais importância e um cabelo menos falso (e o que parece estranho é o cabelo de Wolverine nas cenas que Hugh Jackman teve que filmar quando já protagonizava o filme Van Helsing). Como até Ciclope e Jean Grey estão mais convincentes, todos os X-Men principais têm o devido espaço na continuação, não faltando ainda momentos relevantes para Homem-de-Gelo, Pyro, Vampira ou até Colossus. Isso sem falar na vilã Mística, que volta para exibir suas perícias acrobáticas e marciais nos belos contornos da modelo e atriz Rebecca Romjin-Stamos. Professor-X e Magneto retornam perfeitos.

X-Men 2 é indiscutivelmente um filme superior ao primeiro, tendo até o efeito de “melhorar” X-Men – O Filme (eu, por exemplo, tenho hoje uma opinião bem mais favorável do que a que tive ao sair do cinema em 2000). Além disso, as produções cinematográficas influenciaram os quadrinhos dos heróis mutantes na época, estabelecendo uma identidade com o que Grant Morrison fazia em New X-Men e servindo de base para o trabalho de Mark Millar em Ultimate X-Men. Com o sucesso de público das duas primeiras produções cinematográficas, era grande a expectativa por um terceiro filme, no qual Bryan Singer & Cia. pudessem completar sua “saga”. Em entrevistas, diretor e produtores chegaram a falar de suas idéias para a terceira parte da trilogia. Mas então um “S” e muitos dólares entraram no caminho, e Bryan Singer trocou os “filhos do átomo” pelo “filho de Krypton”. E sem o competente diretor, X-Men 3 acabou sendo algo lastimável!